Eu vi o Sol nascer.
Eu acordo, depois de mais um maldito sonho, querendo dormir de novo, com frio e sede, mas por conta da gripe que me toma, não quero de maneira alguma deixar minha boca seca. A água que tomo desce na garganta como se a rasgasse, e não consigo deixar de reparar na cortina da cozinha, é assim toda vez que bebo água, mas sinto algo diferente agora, e nada me impede de olhar através dela, um clarão, não o sol, mas seus efeitos. Afinal, são seis horas da manhã do horário de verão e ele ainda não nasceu. Eu não posso me permitir olhar, eu preciso dormir, preciso voltar pra minha cama e esquecer que tudo isso existe; digo para mim mesma. Mas esses pensamentos não são capazes de parar meus instintos. Eu preciso fazer isso, e com todo cuidado possível, faço. Acendo algumas luzes, afinal ainda está um pouco escuro. Pego minha cadeira e a coloco na sacada. Visto apenas uma blusa, mesmo com gripe, deixo as pernas do jeito que estão, sem me preocupar muito com o frio que bate nelas. Eles dizem que frio é psicológico, vou pagar pra ver. O céu do outro lado é rosa, uma pintura perfeita, confesso. Penso em escutar os passarinhos e todos os animais acordados, mas sei que vou me decepcionar quando ouvir o barulho dos infelizes carros, então busco meu fone, simples, mas precioso em dias como o de hoje, quando quero um mundinho só pra mim.
São seis e vinte, não sei quanto tempo ainda tenho que esperar, mas não me encomodo, sou eu e o vento, eu e minhas músicas escolhidas meticulosamente e esperar nunca foi tão bom. São poucas as pessoas na rua, quase nenhuma conhecida, em uma cidade tão pequena, não sou capaz de conhecer metade das pessoas, é engraçado, lindo e ao mesmo tempo intrigante imaginar o tamanho do universo, infinito. Lembro de todas as vezes que minha mãe esperou pra ver o sol nascer enquanto eu me arrumava para a escola. Eu nunca parei pra reparar, não porque não me interesso, mas porque acredito que alguns sóis não são pra você. Tem que esperar pelo seu, e vai sentir quando isso acontecer. Ele vai te chamar pra ver, sendo pra nascer ou pra te deixar em um lindo fim de tarde, em uma praia, no alto de um prédio em uma selva de pedra, ou no interior da menor das cidades, basta cinco minutos da sua "vida corrida" para que ele te mostre o quanto é grandioso e real, feito pra iluminar seus dias e você sequer para pra agradecer.
Seis e meia, ele está vindo, entre árvores e silhuetas de casas que agora pouco importam, eu assisto o espetáculo, é lindo. Não precisa de complementos, é incrível por si mesmo, quente, me recuso piscar, não quero tirar meus olhos dele, esperei tempo por um sol que fosse meu, eu não olharia pra outra coisa mesmo que quisesse. Ele brilha, sem nenhuma sombra para escondê-lo. É uma inspiração, uma mão no ombro de uma sonhadora, a lágrima que escorre pelo meu rosto não quer dizer que sou fraca, eu me sinto forte, porque eu ainda sou humana, no meio desse caos todo, se há pessoas que se sentem assim apenas com o nascer do sol em seus rostos, então eu me recuso não ter esperanças. Ainda não está acabado.
Assisto por mais três minutos, a música acaba, essa é minha deixa, eu quero sentir seu poder ainda mais no meu rosto, mas não posso, não quero piorar minha situação com o frio. Tento guardar minha cadeira em silêncio, apago as luzes, e volto a deitar. Eu podia ficar olhando o dia todo, mas assim como esperei por um sol que fosse meu, ele tinha seu momento certo, e já passou, então me permito sorrir em baixo dos cobertores, me sentindo feliz e viva.
Kai Czornei. 2017.