AMOR E SAUDADE. KHALIL GIBRAN.
Essa energia multidimensional que varre os vales da vida e se espraia na morte concentra a saudade.
Se temos o tempo passando, se vimos seu preenchimento escoando, se nada podemos fazer, temos também o sentimento que apaga o tempo, esmaga o tempo, faz diluir sua voracidade implacável; a saudade.
Saudade é memória, refaz, reedifica, mostra por nova construção a imagem do que se foi e não volta, não volta, mas pode ser visitada abrindo-se as portas do tempo, fazendo cessar os vestígios da ausência de visão que o sonho da saudade gera, o renascer, o parto da vontade de ver e viver de novo o que o tempo engoliu.
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"Janeiro de 1908/Abril de 1924
23 de junho de 1909
Acabo de perder meu pai, minha amada Mary; ele morreu na mesma casa onde nasceu, há 65 anos atrás. Seus amigos me escreveram, dizendo que ele me abençoou antes de fechar os olhos para sempre.
Tenho certeza de que meu pai descansa no seio de Deus; mesmo assim, não consigo evitar a tristeza e a dor da sua ausência. Sinto a mão da Morte na minha testa, e penso na minha mãe, na minha irmã mais jovem, e no meu irmão — nenhum deles está mais aqui para sorrir com a luz do sol. Onde eles estão? Neste desconhecido para onde foram, será que tornaram a se reencontrar? São capazes — como nós somos — de lembrar o passado?
São perguntas tolas; sei muito bem que estão vivos em algum lugar no céu, mais perto de Deus do que estamos. Os sete véus — que separam o homem da Sabedoria — não estão mais cobrindo seus olhos, e meus entes queridos não brincam mais de esconde-esconde com a Verdade e a Luz. Mesmo assim, ainda sofro e sinto saudade.
E você é meu único consolo, embora esteja do outro lado deste mundo, conhecendo o Havaí. Os seus dias são as noites aqui de Paris. Mesmo assim, quando eu caminho você está perto, quando eu trabalho você conversa comigo, e quando me sento sozinho para comer, sua presença surge ao meu lado. Há momentos em que sei que não há distância entre aqueles que se amam."