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FODA-SE


 
 

Desde criança, fui ensinada que, por ser uma menina deveria fechar bem as pernas ao sentar-me, sorrir baixo e não chamar muito atenção; que ao crescer, deveria cuidar dos filhos, do marido e dos pais na velhice; mas  ninguém me disse quem iria cuidar de mim ou me perguntou o que eu queria.
 
Assim tem sido o destino da maioria das mulheres, até mesmo em culturas que são mais avançadas na proteção dos direitos femininos. Hoje, já não se preparam as filhas somente para o casamento, mas, apesar da evolução social, ainda assim, o fato da mulher não se casar  ou não querer ter filho é  visto pela sociedade como sinal de "fracasso pessoal". Fugir ao comportamento socialmente esperado é ser taxada de “louca” ou “desviada”. Diante disso, é natural que as mulheres passem  grande parte da  vida  empenhadas em cuidar dos outros, em ser aquilo que se espera delas, em agradar e ser reconhecidas como boas mães, esposas, amantes, filhas e profissionais de sucesso. 
 
Segundo o estudo realizado pela antropóloga Miriam Goldemberg sobre Corpo Envelhecimento e Felicidade, baseado no método estatístico desenvolvido por economistas, chamado de “curva da felicidade”, que tem como símbolo a letra "U" para quantificar o grau de felicidade das pessoas. Por esse método, as mulheres mais felizes são as mais jovens e as mais velhas e as mais infelizes estão entre 40 e 50 anos de idade. Nos primeiros anos de vida o nível de felicidade é alto. Ao longo  do tempo vai havendo um declínio (base do U) e depois começa novamente a elevar-se.
 
Na pesquisa realizada com mais de 5.000 homens e mulheres, Goldemberg tentou descobrir os motivos da falta da felicidade. Através da aplicação de questionários  a pesquisadora chegou a interessantes conclusões. Ao  perguntar às mulheres: "O que elas mais desejava alcançar na vida?", a  resposta campeã foi: "Liberdade". Perguntadas sobre o que invejavam no homem, responderam “liberdade em primeiro lugar" e em  segundo "fazer xixi em pé”. Em outra questão, disseram que o corpo era o que  mais invejavam em outras Mulheres. Esta resposta já era esperada, visto que, no Brasil, vive – se a ditadura do corpo bonito. Já os homens, ao serem perguntados o que invejavam na mulher responderam: "nada". 
 
Quando perguntadas sobre quem iria cuidar delas na velhice, a resposta foi: "As amigas".  Fato esse que reflete o que ocorre na prática, pois tem sido assim a vida toda. Se a mulher vai dar à luz, quem estará lá com ela? Ou em um velório? Se for submetida  a uma cirurgia? Com certeza na velhice será assim também. Há uma identificação muito grande entre “amizade” e “felicidade” no mundo feminino.  Já os homens responderam que quem cuidaria deles na velhice seria a esposa, as filhas ou as netas. Não é à toa que as mulheres após ficarem viúvas consigam continuar sozinhas e com qualidade de vida, enquanto os homens constituem nova família urgentemente. Afinal, quem cuidará deles?
 
A pesquisa apenas constatou algo já visível na nossa sociedade: a  mulher, até os 40 anos quer "carregar o mundo nas costas" e nunca tem tempo  para si mesma. Quando chega aos 40, parece que finalmente a "ficha cai " e a percepção da passagem do tempo  torna-se real. A certeza e o medo da velhice apoderam-se da mulher que, nessa idade, sente a passagem do tempo demonstrada ali, no espelho, à sua frente. Nessa idade, acredita-se  que já se viveu – se  não a metade da vida - mas uma boa parcela dela. E, talvez, a tão almejada felicidade tenha passado ao largo.
 
Quando se chega aos 40 anos parece que não há "depois", tudo é para ontem, ou melhor, para hoje. O "agora" é tudo. É nesse momento que a mulher percebe que não tem mais o corpo de 20 anos e ainda não tem a sabedoria da mulher de 60. Enquanto os primeiros anos foi a fase de concluir estudos, casar e ter filhos ( o que pode não ter ocorrido, pois cada uma tem o seu tempo próprio de realização), esta nova fase da vida, chamada de idade da loba, nada mais é do que uma fase de transição- repensar valores e definir novas metas-  também conhecida como fase “nem nem”, nem jovem e nem velha.
 
Passado esse momento de intensa revolução interna e externa, chega-se aos 50 anos e partir daí tudo muda. E por que a mulher fica feliz novamente depois dos 50 ou 60 anos? Porque passa a cuidar mais de si mesma, redescobre o prazer de sorrir e de conviver com as amigas. Torna-se mais livre e como disse uma médica especialista no tema “liberdade” rima com “felicidade”.
 
O segredo é que a mulher depois de  certa idade não está mais "nem aí" para tudo que lhe prendeu ao longo do tempo; pode ligar o botão do “foda – se” para todos e passar a ser ela mesma.  Quer ri alto em público? Foda-se para quem não gosta!  Quer viajar com as amigas? Foda – se para quem não deseja! Quer comer sem culpa? Foda-se para quem dita corpos esbeltos! Foda-se para o marido que não tira nem o prato da mesa! Foda-se para a casa bagunçada! Foda-se para os críticos de plantão!
 
É o momento de ri de sim mesma, de dar leveza à vida, de não se esconder atrás dos comportamentos que lhe foram impostos. É nesse momento que a mulher descobre que pode viver para si sem correr ou se esconder atrás de alguém. E se já existir um homem em sua vida, deverá ser como companheiro e não mais como senhor de suas vontades. Se ele for mais jovem, não há problema algum, pois quem não gostar: Foda-se!  Nessa fase, não dá mais para seguir um script escrito por outrem. A mulher toma as rédeas da sua vida e o que importa é fazer o que gosta. Ademais, se a velhice vier acompanhada de boa saúde, estabilidade financeira e afetiva, as pessoas nessa idade podem se sentir tão felizes quanto as mais jovens.
 
 Após passarem a priorizar o essencial, vem o momento de eliminar tudo que não lhe faz bem. A mulher não precisa mais provar que pode cuidar de tudo e de todos e já  não se sente culpada por não conseguir. Aliás, a palavra “culpa” é  substituída por “prazer”.  Quando a mulher adquire a liberdade de ser ela mesma, a felicidade se torna a curva única a ser seguida e somente assim,  a “liberdade rima com felicidade”. Ficam para trás as velhas queixas da falta de tempo. As amizades passam a ter um lugar de destaque em suas vidas e tudo que importa agora é aproveitar o tempo que resta para ser feliz.

* Foda-se: Expressão utilizada quando a pessoa não está nem ai com os outros pensam.