ESTAMOS EM UM PROCESSO DEMOCRÁTICO?
Estamos em um processo democrático? Sim, no que diz respeito às escolhas. E tão só.
Democracia é vínculo com a liberdade que esbarra nos freios da responsabilidade. Assim todos podem manifestarem o que quiserem desde que não atinja direitos de terceiros ou “erga omnes”. Existem as tutelas individuais, e coletivas.
Chamemos de democracia a reserva legal, não a representação, dizia e digo ensinando, creio que um bom exemplo, que é o repositório do direito como norma. Por exemplo, um grande armário com milhares de gavetas guardam os direitos subjetivos, nossos, legislados. Quando um deles é ameaçado (posto em risco) ou violado (retirado,vulnerado, afastado), é posto em virtual estado de defesa. Movimentamos esse direito violado. Tiramos da gaveta e o levamos ao judiciário para retornar à sua higidez ou afastar a ameaça. Essa a ideia genesíaca da ação. Processo.
Isso é viver no Estado de Direito, uma representação democrática dirigida a todos e que nasceu dos legisladores que estão nas casas congressuais. Legitimidade humana totalmente impossível em países onde não há liberdade de expressão e de ir e vir. Infantil nominar de democrático os regimes de exceção,felizmente poucos no mundo, como fazem os apedeutas em suas convicções pouco esclarecidas.
Realizar seu direito violado ou ameaçado tem como estrutura básica o processo. Minha inclinação maior é pelo direito adjetivo, processual, o subjetivo, guardado na gaveta do grande armário, não se realiza se posto em movimento inadequadamente. Como ir ao médico com problema digestivo e ele ministra remédio para outro órgão que está em desalinho biológico.
Atualmente, apenas a Suíça adota a democracia direta, a verdadeira democracia. Como na antiguidade, em Atenas, o povo se reúne em assembleia para deliberar sobre vários assuntos. Essa reunião assemblear denomina-se Landsgemeinde, decorrente do pacto de 1291 da Confederação Helvética, retificado em 1315. Não é possível, por ausência de praticidade, tal modelo para países continentais como o Brasil. Mas a consulta popular pede e deve ser mais valorizada no Brasil.
A forma pela qual os cidadãos participam das deliberações que ordenam politicamente as sociedades são originadas de três tipos de democracia, que podem ser classificadas em direta, indireta (ou representativa) e semidireta (ou participativa).
Na democracia representativa, o povo participa indiretamente das decisões. Há delegação, cíclica e formal, organizada a coletividade por normas na escolha representativa do povo. Todavia, não se trata de eleições cíclicas, onde por meio do voto, indicam-se autoridades governamentais. A eleição define a preferência programática partidária. Em 1998 estudou-se no Brasil a implantação da consulta popular em parte nos moldes suíços frustrando-se por absoluta impraticabilidade.
O termo democracia primeiramente nasceu da democracia direta, forma de governo em que os cidadãos tomam as decisões, diretamente, alcançando todos. Estamos diante da democracia pura, o povo se autogoverna, só foi exercida na antiguidade, Atenas e Roma, com enorme diferencial no que se exerce hodiernamente como democracia.
O inigualável Bobbio nos remete à característica principal da democracia representativa, participação dos cidadãos, direta ou indiretamente, nas deliberações que em diversos níveis (local, regional, nacional) e nos mais diversos setores (escola, empresa etc.) interessam à coletividade, balizadas por seis regras fundamentais, a saber:
1. todos os cidadãos que tenham alcançado a maioridade, sem distinção de raça, religião, condição econômica, sexo etc., devem gozar dos direitos políticos, isto é, do direito de expressar por meio do voto a própria opinião e/ou de eleger quem se expresse por ele;
2. o voto de todos os cidadãos deve ter peso igual (isto é, deve valer por um);
3. todos os cidadãos que gozam dos direitos políticos devem ser livres para votar, conforme opinião própria, formada o mais livremente possível, isto é, numa competição entre grupos políticos organizados que disputam entre si para agregar os anseios e transformá-los em deliberações coletivas;
4. os cidadãos devem ser livres, também, no sentido de possuírem alternativas reais, isto é, de poderem escolher entre várias alternativas;
5. seja por deliberações coletivas, seja por eleição de representantes, vale o princípio de maioria numérica, mesmo que possam se estabelecer diversas formas de maioria (relativa, absoluta, qualificada) em determinadas circunstâncias, previamente estabelecidas;
6. nenhuma decisão tomada pela maioria deve limitar os direitos da minoria, em particular o direito de tornar-se maioria em igualdade de condições.
O ideal de que democracia constrói legítima e amplamente melhor captação popular por meio de constantes consultas populares sobre assuntos políticos, o que seria desejável para democracia representativa, complementando-se, substituída pela democracia direta, não é recente, nem se restringe ao Brasil.
Em ensaio publicado sob o título de “O futuro da democracia – uma defesa das regras do jogo”, Norberto Bobbio discute as relações entre democracia representativa e democracia direta e ensina que Jean-Jacques Rousseau, ressaltava que a soberania não pode ser representada e, por esse motivo, o povo inglês acreditava ser livre, mas só o era durante a eleição dos membros do parlamento. Depois os eleitores voltavam a serem a mesma coisa que foram. Rousseau nominava-os como escravos, aditando que verdadeira democracia jamais existiu, nem existirá, aglutinação de muitas condições impossíveis de serem reunidas.
A primeira delas seria um estado muito pequeno, fácil de reunir o povo, cada cidadão conhecendo todos os demais (caso dos cantões suíços); segundo uma grande simplicidade de costumes, afastando a multiplicação dos problemas e conflitos de interesses maiores. A tudo juntando-se igualdade de condições e fortunas, ainda segundo Rousseau, para quem, se existisse um povo de deuses, seria governado democraticamente.
Mas governo perfeito não é do molde do humanos. Mostram as ideologias.
SOBERANIA NÃO PODE SER REPRESENTADA. SÓ O INTERESSE DE PARTE.
Escravos o que abrigam essa balela.