Histórias com Sédea, a minha sereia

Conheci minha sereia num daqueles dias em que as coisas não respiravam bem. Nossos caminhos se cruzaram e ela entorpeceu meus ossos de jeito que nenhuma outra fez. Confesso que fiquei sem ação logo de cara, gaguejando até no olhar. Não que fosse de uma beleza descomunal, ou que encobrisse algum encanto enfeitiçador. Nada disso. Sédea, seu nome, soube acolher meus sentidos apagados como nenhuma outra ousou antes. Foi capaz de desparafusar meus medos, um atrás do outro, e ressuscitar aqueles brilhos que julgava enterrados de vez. Sédea rejuntou minhas fagulhas cuspidas e, acredite, também meus cheiros fugidos. Porque a gente vai deixando escapulir alguns cheiros que, tempos passados, davam aplausos e riam sem parar. A minha sereia trouxe à tona poemas já desencarnados e os fez virar folia de novo. Só ela pôde entender aqueles cambaleantes soluços, tantos murros que dava em mim mesmo sem razão. Aquela sereia, quem diria, foi a única que penteou meus sonhos encardidos e os chamou pro ninho, pra folia. Assim aquele cara curvado, de alma franzina e confusa, enormeceu. Aquele cara tanto pisado pelas farpas envenenadas do descaso, virou leão, virou rei. Só poderia, diante de tudo isso, abandonar minha guarita e seguir com ela mar adentro, sem nenhum fiapo de dúvida. Juntos teríamos o universo ilhado na nossa mão, juntos só engoliríamos vitórias, uma atrás da outra. Bem diferente daquilo que antes se fazia meu, desprezando minhas faíscas e suores. Por ela abandonei frutos, raízes, tesouros e o meu cais inteiro. Por Sédea, catei todos pedaços que foram chutados de mim e refiz aqueles passos largos que. tempos atrás, tanto me tatuaram, tanto me ovacionaram. Esperei minha vida toda por ela, confesso, achava que a tinha encontrado tempos atrás, mas enganei meus guizos, todos eles. Sédea entrou na minha vida quando chegava no alvorecer e achava que nada mais viria orvalhar, ancorar, gozar. Então seguimos juntos e nos encenamos felizes sem plateia, sem ensaio, sem orquestra. Só e e a minha sereia e nada mais, nem ninguém mais.

--------------------------------------------------

visite o meu site www.vidaescrita.com.br

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 13/02/2018
Código do texto: T6252388
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.