Tempo de Conchinhas

Era tardinha, tinha chovido até às onze, mas firmou o tempo e decidi caminhar. Caminhei pela avenida, vi carros e ônibus disputando as faixas de rolamento com transeuntes apressados de um lado para o outro. Sentei-me no banco de metal do calçadão. A pintura azul descascada me lembrou que o tempo se encarrega de trazer as transformações. O tempo é o senhor de mudanças de toda a natureza. Ele traz e ele leva... Como aquelas ondas quebrando na areia. Deu vontade de descalçar meus sapatos e pisá-la mais uma vez. Dobrei as barras da minha calça e desci a escada de cimento fria. Pisei a areia ainda úmida mas de um toque macio que me fez sorrir, causou-me certa alegria calcar e sentir meus pés afundando, formando sulcos na praia deserta. Certamente ficariam ali aquelas marcas até a maré cheia... A lua espiava a minha façanha, o céu num tom azul entre o claro e o anil dava um certo ar de melancolia, mas eu caminhava em paz. Ouvindo cada vez mais longe os sons de buzinas fui me aproximando das águas espraiadas. Uma onda já se recolhia quando outra espumante envolveu-me até acima dos tornozelos... Água morna encimada por outra mais fria. Ah que sensação gostosa eu senti. Demorei-me ali por um tempo... Cinco minutos, dez talvez. Curtindo o ir e vir das ondas que cantavam uma canção em meus ouvidos. Uma melodia diferente, acompanhada pelo auxílio luxuoso do vento. Agucei minha escuta, e pude compreender as palavras que ele trazia. Ele dizia mais ou menos assim, "O tempo leva e o tempo traz/Ele leva o que jaz, mas de presente, umas conchinhas traz/". Nesse momento eu senti uma enorme gratidão.

Não sei explicar ainda o porquê, mas passei a apreciar as conchinhas... Tenho umas até hoje guardadas num bolso de camisa.

Cláudia Machado

9/2/18

Cláudia Machado
Enviado por Cláudia Machado em 10/02/2018
Reeditado em 12/02/2018
Código do texto: T6250522
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