Habeas corpus para liberar carro... Por que não?
 
 
 
Um Desembargador, do Estado do Maranhão, recomendou que a OAB reavaliasse o Advogado que impetrou um habeas corpus para liberar um carro apreendido no órgão de trânsito. Segundo ele, por não ter conhecimentos mínimos para exercer a profissão.
 
Em termos práticos é como se o paciente fosse ao  médico com dor de barriga e ele  lhe receitasse remédio para dor de dente. É tudo remédio, mas não tem o mesmo efeito. Habeas corpus, é uma ação constitucional que visa liberar uma pessoa que esteja presa injustamente. Não é aplicável para liberação de objetos ou coisas. No caso, a liberação seria de um carro, constituindo-se num erro "grosseiro" por parte do advogado.
 
Por outro lado, pensei que ultimamente, todos podem pedir qualquer coisa na Justiça brasileira. Juiz pode pedir para receber auxílio moradia em dobro, gente se aposenta sem nunca ter trabalhado no órgão; e, segundo a ainda não empossada Ministra do Trabalho, qualquer um pode pedir o que quiser na Justiça do Trabalho. Ela tem razão, tem gente que pede até direitos trabalhistas, não é mesmo! Dai pensei: por que não pedir a liberação do carro através de habeas corpus? Afinal, com o status que carro tem no Brasil, é quase gente! Tem pessoas que matam e morrem por causa de um carro.
 
Ironia à parte, esse seria somente mais um dos casos bizarros que acontecem no Judiciário, pois é comum ocorrer erros de impetra-se uma ação por outra, como também temos sentenças bizarras e teratológicas. O problema é o momento de extrema fragilidade em que se encontram as instituições no Brasil. Ao arvorar-se no direito de fazer essa recomendação, chegando o Desembargador ao ponto de dizer que Rui Barbosa teria vergonha de pertencer à classe dos advogados, recomendando à OAB que  reavaliasse e, possivelmente, até  cassasse a  licença do advogado, ele acirrou ainda mais a já frágil relação entre essas duas instituições.
 
 
Para entender melhor: as instituições no país estão sob ataque e se atacando, diria que se alguém pretendesse conquistar  o Brasil,  esse é o momento certo, pois aqui, vive se a lógica da Inglaterra nas suas grandes conquistas territoriais: dividir para reinar.  Nunca se viu um país tão dividido, ninguém mais se entende, a magistratura está sob ataque, alguns justos, outros por pura maldade. A melhor defesa, às vezes, é o ataque.
 
A celeuma não vem de agora, desde a implantação do Código de Processo Civil que entrou em vigor em 2016, que ouço uma aversão ao novo diploma legal sob o argumento de que é um código para os advogados, eu nem sabia que tinha isso.

Adveio, como se fosse a revolta dos membros do corpo, que cada ramo da Justiça começou a publicar resoluções dizendo que ali não se aplicava o CPC, também não sabia que podia isso.  Não fui informada que o anterior era o Código dos Juízes, pensava apenas que era o  Código de Processo Civil do Brasil.  Quem ganhou com essa discussão? Ninguém, só gerou insegurança, pois eu, que todos os dias faço audiências, ouço os advogados perguntarem: O CPC se aplica aqui?

 
 
Semanas atrás o Presidente da AJUFE (Associação dos Juízes Federais) resolveu explicar o porquê do auxílio moradia. O tiro saiu pela culatra e a emenda ficou pior que o soneto. Na sua visão, o problema é que os advogados ganham mais que os juízes, o que geraria intranquilidade... Isso mesmo.! Essa foi a explicação.  Seria cômico se não fosse ridícula. Temos argumentos melhores (estão em outra crônica).
 
Ressalte-se ainda, que advogados são remunerados pelos serviços prestados e os que ganham muito bem são pouquíssimos, geralmente ligados a escritórios com grandes contas. A esmagadora maioria, vive trabalhando muito pra sobreviver; não têm férias ou garantia alguma, vivem literalmente do suor da labuta diária.

É um comparativo de  mau gosto.  É como dizer que: médicos, engenheiros ou advogados, não podem ganhar mais que um Juiz. Esqueceu-se o D. Magistrado, que são profissões diferentes e que Juiz é pago com dinheiro público. Felizmente, esse pensamento não reflete o da magistratura como um todo.

 
Agora, mais essa celeuma aqui do habeas corpus, que gerou nota de repúdio por parte da OAB- MA. E assim, as instituições, ao invés de lutarem por  um país melhor, estão se digladiando em torno de "picuinhas", que  nos rebaixa ainda mais a um estado de anomia social em que todos perdem com o descrédito das instituições.