Alguém Mexeu no Meu Queijo...

 

 

            Estou sempre citando Millôr. Como não fazê-lo? Afinal, através do humor, elucida claramente os pontos fracos e fortes da fisionomia nacional. Segue-se então uma de suas pérolas: “confissão é aquilo que o criminoso faz depois de algumas horas de porrada”.

            O que vou fazer agora é uma confissão. Não apanhei, no sentido físico, mas assim como uma parcela da população nacional, sinto que “alguém mexeu no meu queijo” ou em muito mais do que isso.

            Não farei oposição ao governo (Brasil, você ainda vai ter um). Pronto, já estou desviando do assunto de novo. Afinal, trata-se de abordar pela tangente e ir, devagarzinho, comendo pela beirada, como faz o mineiro, o novo movimento que tem o propósito de tirar o sono de algumas “elites” que estão no poder.

            Tentam metralhar o movimento dizendo que não é legítimo.

            Pergunto: o que legitima um movimento popular?

            A queda da Bastilha foi legítima? As mães da praça de Maio são legítimas? O SMT é legítimo? Fazer greve na porta de fábrica é legítimo? Votar em metalúrgico é legítimo? Não quero que o leitor perca a paciência comigo. Em democracia, manifestar-se indignado, dentro dos limites da lei, é um direito.

            Urge agora esclarecer aos detentores do bastão, e do cajado, configurados pelo voto em gabinetes lustrosos de Brasília, que uma parte do povo cansou. Dizem ser a parte que anda de carro, que lê jornais e que freqüenta aeroportos. 199 destes desapareceram em uma tarde-noite chuvosa. Seriam eles exilados da massa populacional?

            Povo não é apenas quem ganha salário-mínimo, labuta em trabalhos braçais e depende de apoio do governo. Pertence ao povo todo cidadão deste país com direito a voto, ao grito e ao protesto.

            Não digo que o movimento esteja certo. O que defendo é o direito dos seus membros em protestar, assim como se protesta por melhores salários ou terra para plantar.

            Falta-nos mais protestos, mais indignação, mais brados pela democracia.

            Queria estar mais alegre hoje, mais feliz, mais contente. Não pertenço a  nenhum grupo que recebe mensalão, não fui eleito para cargo-público, mas tenho um título de eleitor, guardado em uma pasta amarelada e desbotada. A cada dois anos eu o levo para passear, para escolher candidatos, na vã esperança de que um dia todos nós nos cansemos e nos levantemos por um país melhor.

            Teotônio Vilela dizia: de pé, de pé pelo Brasil!

            Apesar do que parece dizer, o movimento “Cansei” afirma que não é hora de cruzar os braços e esperar, mas de levantarmos, sacudirmos a poeira e procurarmos ser melhores cidadãos, cumprindo, cada um, a parte que lhe toca.

            Não adianta mudar de país, o melhor é tentar mudar o país.

            Não poderia dizer outra coisa. Final de confissão sem porrada, a não ser que se considere porrada os tapas que a vida nos dá...