Estrangeiro no Manicômio (alguma parte, sei lá qual)
Estrangeiro no Manicômio
Era um sábado de inverno, porém quente, muito quente. Quando acordei de sonhos estranhos, a primeira reação foi abrir a janela... O sol engoliu o quarto, a luz invadiu meus olhos, e eu, fechei a janela imediatamente. Como quem está perdido, levantei da cama de repente, coloquei os pés molhados de suor no chão, me arrastei até a mesa, onde olhei a hora... O relógio marcava meio dia, e eu, tinha que tomar banho e uma boa xícara com café. Meu dia só estava começando. O cigarro tinha acabado, e eu não queria sair na rua.
Geralmente não faço muito no dia, hoje mesmo, me incumbi a tarefa de ouvir dois álbuns, um da banda Television com o Marquee Moon, e outro dos impecáveis do Radiohead. A musica nesses últimos dias e como sempre, foi a minha companheira, sem ela me sinto sozinho. Eu estava em outra cidade distante, não tinha identidade, a rua era um labirinto e na noite eu tinha uma xícara com café para beber e perder o sono, e nisso, folhear um velho livro de estórias mal contadas. O vento batia no vidro da janela, eu abria e deixava-o entrar. Sempre chegava o momento em que as memórias invadiam meus pensamentos... Olhar para o teto e pensar; Que droga estou fazendo aqui, tenho um quarto com uma escrivaninha para estudar e uma faculdade para acompanhar e esperar o que será de mim daqui a quatros anos. Sociedade de merda, tudo é vazio, tudo é vazio. Neste momento concede-me tudo aquilo de impecável.
A noite chegou e com ela também vem tudo que é de mais sagrado; inspirações, drogas, musicas, lua, sorrisos, poemas, solos! Luzes apagadas não vêem nada, nada pode ser prometido, tênis rasgado protege os pés, camisa suja economiza água, calça rasgada não consome dinheiro, e os sonhos são sonhos, eles não deixam a realidade cair sobre mim, mas não prometo absolutamente nada. Hoje posso estar estudando, amanhã estarei perambulando pela rua tomando um gole de vinho barato quente e salvando as baratas que cruzam o meu caminho. Os resquícios do meu tempo, as migalhas do que já fui, e tudo foi somente dança que não dancei, odeio dançar. Numa dessas, chega um senhor simpático falando sobre Raul Seixas, “Meu jovem, o futuro nunca esteve tão próximo.” Ergo-me do banco velho da praça vazia, e a consciência me diz que tenho uma vida para viver e vários vinhos para tomar, mas tudo ainda é vazio, como tudo. Sinto que podia ser diferente. Fiz musicas com meu amigo, e elas marcarão nossas memórias. Só consigo lembrar das coisas mais banais, letais, porém vitais. Nada nunca importou, mas numa hora ou outra o peso do vazio cai. A realidade chega, e tenho que ir.
De repente aparece a estrada, cigarros, bebidas, musicas e poesia. Tudo isso se formula de um modo que representa uma diversão e prazer de momento excepcional. Não tem nada melhor que ouvir uma bela musica, ler um bom livro. São coisas que vem para te fazer bem, e a arte serve para isso, como diria o poeta Marcio Medeiros, para nos manter vivos, úteis e eternos. Ouço a musica da banda Pink Floyd – Shine On Your Crazy Diamond e me sinto em um sonho. É tudo muito surreal, psicodélico, te faz fechar os olhos e sentir, é uma viagem da loucura, mas por vezes preciso sair do meu tumulo e me expor à rua. Desço as escadas atenciosamente para não cair. A luz nunca acende imediatamente, é preciso ter noção do espaço onde pisa. Encontro quatro bancos sentados embaixo duma arvore, conversam, tomam alguma bebida, leem o jornal, enfim, vivem como humanos. Mais adiante atravesso a portaria. O cara nunca me reconhece, sempre me pergunta onde moro. É repetitivo. De repente, por um impulso chego à face das ruas sem calçadas, e vejo o lixo perdido sendo recolhido, e homens deitados nos becos despercebidos. Os carros apressados passam, e vejo pessoas estagnadas, mudas, indelicadas, enfim, vivem como bancos.
Algum dia de algum ano. Escrevi para o vento, o vento leve, suave, e sozinho.