Uma estação chamada vida
Uma estação chamada vida
Recentemente eu estava divagando, após uma conversa com uma amiga sobre as futuras gerações, quando veio à tona um piscar relevante sobre a possível escassez de passageiros de um futuro próximo. Após a emancipação sexual da mulher com a descoberta da pílula anticoncepcional e a autonomia sobre a palavra escolha, as fêmeas reduziram seus rebanhos. As famílias até o início do século procriavam a revelia das vontades matriarcais. Nossa herança atual é ainda de vários irmãos biológicos, tios, madrinhas, primos e agregados. A geração dos meus avós colocava entre seis e oito filhos em média para habitar a vida. Encher os comboios, que param em estações para que cada uma desça e inicie a própria jornada. Compartilhar a vida, amar e ser amado são desejo íntimo e pessoal e não meta.
A música do Milton Nascimento é mesmo uma metáfora impecável do que sejam os lados dessa mesma viagem. Essa estação pulsante de todos os dias em um vai e vem deixando gente querendo ficar, outros desejando partir, alguns nem desembarcam e a vida se repete nas diversas estações. Os núcleos familiares eram compostos por pai, mãe, dezenas de filhos com a certeza de que dariam frutos de uma árvore genealógica farta, pois certamente a maioria se casaria. Com a autonomia e emancipação profissional da mulher, o casamento se tornou um meio e não uma finalidade. Depois veio o pronunciamento da mulher moderna com a produção independente, nos idos anos 80. Mas bastou chegarmos à era virtual e informatizada, para que nossa atual geração adulta dar um passo rumo a altivez das escolhas. Famílias multifacetadas e ramificadas por maneiras diferentes do “estar junto.” As estações da vida se ampliam. Temos desembarques mais atraentes, mais nossos, mais a minha cara. Somos a geração do estilo, do perfil personalizado. Colocamos menos pessoas no mundo, mas agregamos mais quando podemos ter enteados, irmãos de pais ou mães diferentes e casais do mesmo sexo. Há algum tempo li uma reportagem sobre o Canadá e sua precária geração de jovens nativos nos anos 2000. Os casais liberais dos anos 60 optaram por repensar a natalidade, o que gerou um baixo índice da população adulta hoje, implicando na vida ativa do país. E a tendência, segundo alguns sociólogos, é de que isso vá expandindo em muitas outras culturas. A sociedade sente atração em usar redes sociais como espaço de confluência compartilhando mais e agregando afetivamente menos. Queremos conhecer e ter milhões de amigos sair por aí, ler mais, produzir mais, sermos artesãos dos trilhos, enfim, padrão familiar imposto é coisa do passado. E que o trem esteja sempre carregado de histórias de gente a sorrir e a chorar. Pois a vida sempre dará a partida de alguma estação.
Mônica Ribeiro