MEU SERVIÇO MILITAR: O SOLDADO QUASE CEGO

MEU SERVIÇO MILITAR: O SOLDADO QUASE CEGO

Prestei serviço militar obrigatório no glorioso 2º Batalhão de Caçadores, quartel da Infantaria, em São Vicente, São Paulo. Foi uma época dura para um jovem que só estudava e nadava se deparar com as regras rígidas de conduta, cheia de obrigações, horários, punições. A maioria dos jovens fazia tudo para não servir. Meu pai era militar e, antes de me apresentar, pedi a ele que me livrasse dessa obrigação. Fomos até o quartel, falamos com o capitão médico, que prometeu me colocar como excesso de contingente. Mas o Capitão Miorim, falou para seu amigo esquecer essa conversa e acabei iniciando o meu período de soldado. A sequência de procedimentos até a apresentação no quartel para iniciar o serviço é mais ou menos a seguinte: o sujeita se alista, passa por uma triagem de sua condição social e familiar, passa por exames médicos, é definida em qual unidade vai prestar o serviço e aguarda ser chamado para se apresentar. Os exames médicos são feitos em grupos grandes de rapazes, onde todos ficavam nus e os médicos e enfermeiros examinam aquele bando e começam uma chamada de avaliação individual. Muitos jovens ficam constrangidos com a situação e os militares reforçam essa situação com brincadeiras de péssimo gosto. Sempre pratiquei esporte, estava habituado com essas situações. Mas a garotada morria de vergonha. Os caras ficavam torcendo para que fosse encontrado algum defeito, como pé chato ou outra deficiência que provocassem sua dispensa, e isso gerava algumas passagens hilárias.

Na avaliação oftálmica o sujeito era colocado, em pé, a uns três metros de um quadro com letras ( Tabela de Snellen) e, tapando um olho, lê as letras indicadas por auxiliar do capitão, no caso um sargento, que vai apontando para letras cada vez menores até o menor tamanho que o examinando consegue reconhecer. É comum esse teste nos consultórios médicos, como primeira avaliação de acuidade visual. Tudo ia bem até que um rapaz só reconheceu as letras das duas primeiras faixas, que são as maiores. Da segunda faixa em diante, não reconhecia ou confundia as letras D com B, F com E, L com I, e assim por diante. Na terceira faixa, não via nada, só borrões no quadro. O sargento perguntou se ele havia vindo só e o candidato afirmou que sim. O sargento imediatamente chamou o capitão médico, que parecia ser muito rigoroso. Após dez minutos de espera, o capitão foi até onde estava o quase cego. O diálogo:

Sargento:”- Capitão, esse rapaz quase não enxerga. Não sei como ele conseguiu chegar sozinho ao quartel.”

Capitão médico: “- Por que?”

Sargento: “-Só reconheceu as letras maiores da tabela de Snellen e não vê nada a partir da terceira linha de letras. Vamos telefonar para casa dele e pedir para um familiar vir busca-lo. Não ´pode sair só.”

Capitão médico: “ – Antes vou refazer pessoalmente o teste.”

Ato contínuo, foi até onde estava o elemento, segurou por trás com uma mão no pescoço do mesmo e começou a ordenar em alto e bom som:

“-Leia a primeira letra!”

“-E!”

“- Leia a segunda linha”

“- F, P!”

“- Terceira linha!”

“- T, O, Z!”

E assim leu, tremendo de medo do capitão, até a linha 8 ou 9, que indicam excelente visão. Após esse “teste”, o capitão comentou: “- Tenha certeza que você vai servir o exército, seu malandro!”

O salão todo caiu na risada e fez muita gozação com o camarada.

Paulo Miorim 29/01/2018

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 29/01/2018
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