DAS COISAS QUE NÃO CONSIGO LEMBRAR
Tem vezes em que a minha memória gagueja, vira gelatina. Já em outras, dá drible em Deus, se mostrando feita do melhor granito. Assim levo meus dias, só esperando o momento em que virá à tona e quando ficará afundada para sempre. Tem horas em que lembro de detalhes que os próprios detalhes nem notaram. Aí é sopa no mel, dá um prazer danado, fico feliz toda vida. Mas tem quando esqueço de algo totalmente, como se tivesse sido deportado do meu cérebro numa avalanche que escombra tudo. Isso me enche de tristezas, de medos, de inseguranças que não se calam nunca mais. Pra alguém que se diz escritor como eu, a memória seria a primeira na fila nas ferramentas que faria uso no trabalho. Mas como sei que ela não é lá essas coisas, como todo bom farsante finjo que sei de tudo, que lembro de tudo. Faço isso com tal verdade e desenvoltura que meus escritos biográficos são recheados de fatos de lá bem atrás, assim ninguém desconfia da minha memória maltrapilha, ninguém mesmo. Assim vou tocando o barco, lembrando e esquecendo das coisas numa alternância sem roteiro nem métrica. Espero que num belo dia essa memória capenga reencontre sua meada e passe a cumprir o papel com menos tropeços que, confesso, me botam em algumas enrascadas que não quero nem lembrar. Nisso minha memória nunca falha, nunca derrapa, nunca enrosca.
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