SERÁ QUE NADA MUDOU ENTRE PAIS E FILHOS?
SERÁ QUE NADA MUDOU ENTRE PAIS E FILHOS?
Cansei de ouvir os mais velhos falarem mal dos meus tempos de infância e adolescência. Eu era terrível, levado, arteiro, teimoso. Pelo menos duas ou três vezes por semana levava uma surra de minha mãe, para aprender a me comportar, para não quebrar nada, para não sumir, para não se sujar, para tomar banho, para sair do banho, para falar por favor e obrigado, para não correr na missa, para não amarrotar a roupa da missa ( fazia questão de usar gravata), para não cuspir no chão, para não cuspir na boca dos cachorros ( eu adorava), para não sair da mesa antes dos outros, para não sentar na mesa depois dos outros, para não correr na hora de apanhar, para não segurar a mão dela com chinelo, etc., etc.. É impressionante a infinidade de motivos que as mães inventavam para dar umas palmadas, chineladas e cintadas no lombo das crianças. Irritava-me quando os adultos falavam que agradeciam cada surra que haviam levado dos pais. Acho que não se lembravam de como doía e ardia uma boa cintada.Os adultos comentavam que as crianças eram mal criadas, e o que era “antigamente” para eles, era muito melhor que os “tempos modernos” dos meus tempos de criança. Contavam também que a educação era muito melhor, que aprendiam mais matérias, que o nível de aprendizagem era melhor, etc..
Os adolescentes, então, eram muito mais mal falados. Os cabelos compridos, influência dos Beatles, eram sinais que o mundo ia acabar. Eu olhava quadros que mostravam Jesus Cristo, os Três Mosqueteiros que eram quatro, Luís XIV, e outros diversos personagens históricos, todos cabeludos, e pensava que os adultos não sabiam nada de História e de Religião. Mas esses comentários faziam-me sentir um quase marginal. Nossas músicas eram péssimas, rock era um horror, bossa nova era o fim da música brasileira, Roberto Carlos e suas gírias eram o anúncio do fim do mundo.
As moças sofriam mais que os rapazes. Todas tinham que ser virgens até casarem. Usar shorts só para ir à praia, biquíni que tapasse tudo era obrigatório. Uma polpinha à mostra ou parte de cima menor e pronto, a moça estava mal falada. As mães fiscalizavam a menstruação, namorar só em casa, passear só com a mãe do lado, etc. Era uma dureza, tanto para os namorados quanto para as namoradas. Uma sofrência danada. Tudo isso gerava histórias sensacionais, como só podiam namorar pessoas aprovadas pelos pais, os jovens partiram para a contestação dos valores impostos pelos adultos. Foi uma época difícil. Em São Vicente, lembro de alguns casos hilários. Essa história aconteceu no Gonzaguinha, em frente ao Restaurante Gaúdio: a mãe de uma moça vigiada dia e noite, começou a flertar com um cara que a progenitora odiava. Certo dia a vigilante senhora flagrou a moça de mãos dados com o desafeto. Violenta, a mãe partiu para a agressão física após proferir palavrões impensáveis para uma senhora. O rapaz desceu a escada que acessava a praia e entrou no mar até a altura dos joelhos. Formou-se a seguinte cena: a mãe chamando o cara, dizendo que ele não era macho para enfrentá-la e ele concordava com ela. Isso até a mãe se cansar e arrastar sua donzela para o apartamento que morava, bem perto dali. Uma outra senhora, alta e forte, acompanhava suas duas lindas filhas a todos os bailes, todos os mingaus do Tumiarú e, como um cão de guarda, só permitia que as moças dançassem com quem ela autorizasse. Pagar nas mão da moça só após alguns dias de namoro. Mão nos ombros demorava mais. Beijo na boca e... parava por aí, pois muitas vezes não se sabia o que fazer depois disso.
De repente, um americano chamado Alfred Kinsey, que foi reprimido sexualmente na juventude, pesquisou a sexualidade humana e o comportamento sexual dos jovens americanos. Lançou dois livros sobre o comportamento dos homens(1948) e da mulheres (1953). Uma verdadeira bomba nos conceitos e preconceitos da época. Embora não publicado no Brasil, a influência nessa mudança de paradigma mudou o comportamento da juventude dos anos 60 em diante. A partir de Kinsey apareceram muitos sexólogos, contestando ou aprofundando os estudos ininciais. Com a pílula anticoncepcional, em 1966, começou libertação da mulher no que diz respeito aos riscos de gravidez.
Quase tudo mudou no comportamento humano. Não se bate em crianças, nossos filhos dormem com seus parceiros em nossas casas, os jovens vivem entocados nos quartos com seus vídeos games, a adolescência vai até os trinta anos Nós, agora “antigos”, criticamos os jovens e vivemos dizendo que a nossa época que era certa. E assim vamos.
Paulo Miorim
26/01/2018