Lula aqui e lá

A atenção do Brasil e do mundo estará voltada para Porto Alegre hoje e amanhã. Desde as primeiras edições do Fórum Social Mundial que isso não ocorria. “O motivo todo mundo já conhece”: o julgamento em segunda isntância do ex-presidente Lula no TRF da 4ª Região.

O Rio Grande do Sul é protagonista na história brasileira. O maior estadista do país, Getúlio Vargas, é daqui, de São Borja. Seus herdeiros políticos, originários do trabalhismo getulista, como João Goulart, Brizola e Dilma Rousseff (gaúcha por adoção) foram personagens ativas e determinantes no plano nacional. Contemporâneos de Vargas, temos gente do quilate de Osvaldo Aranha (presidiu a segunda Assembléia Geral da ONU), Lindolfo Collor (primeiro ministro do Trabalho) e Luis Carlos Prestes (dia 3 de janeiro completou-se 120 de seu nascimento), imortalizado pelo escritor Jorge Amado como “O Cavaleiro da Esperança”. Antes de todos esses, tivemos os revoltosos da “Revolução” Farroupilha, a insurreição armada mais bem sucedida do período regencial, pré-República.

E é “aqui e agora”, nesses dois dias com previsão de chuva forte, que o rumo do país chega a mais uma das encruzilhadas de sua existência. Em jogo, o sinal verde ou vermelho para a candidatura à presidência do líder maior petista, Lula, figura nacional possuidora de projeção internacional. Por ironia, o sinal “vermelho” não lhe será favorável, no caso. Já o verde liberará seu trânsito político em 2018. Todavia, o mais provável será um sinal amarelo, pois, mesmo condenado amanhã, permanecerá com sua candidatura em andamento lá em Brasília.

Quem garante são os jornalistas Elio Gaspari, do Correio do Povo, e (o insuspeito) David Coimbra, de Zero Hora. E o afirmam calcados na avaliação de grande parte dos conceituados juristas brasileiros, que defendem categoricamente essa tese, amparados no conhecimento do rito processual a permitir a protelação de possíveis efeitos condenatórios mediante recursos da defesa.

Nesses dias veremos também aqueles que irão às ruas clamar pela condenação ou absolvição. Num lado, grupos como o Vem Pra Rua e o MBL (o “MST” dos liberais), que puxaram as mobilizações pelo impeachment de Dilma, e, curiosamente, a chefe de gabinete da Presidência do TRF-4, que assinou um abaixo assinado virtual pedindo a prisão de Lula, réu amanhã no mesmo tribunal; noutro pólo, o PT e os movimentos sociais alinhados à esquerda. E tanto prós quanto contras possuem “sólidos” argumentos jurídicos para embasar sua militância: são os mesmos conceituados juristas, agora divididos, emitindo pareceres divergentes.

Aliás, o que ocorre no Brasil desde 2014 derrubou mitos que ainda seduziam ingênuos e instrumentalizavam cínicos: os da imparcialidade e neutralidade do Judiciário e dos meios de comunicação. O primeiro se revelou o reduto da subjetividade, sujeito às mesmas motivações políticas, ideológicas, religiosas, filosóficas e econômicas a permear todo o tecido social da nação. O protagonismo militante de juízes e promotores visto no período, por um lado, e decisões divergentes sobre a mesma questão, por outro, atestam essa realidade. Quanto à mídia, bem, não ofenderei a inteligência de vocês discutindo o óbvio ululante (ah, Francis) de sua parcialidade: ela FAZ política!

E, finalizando, no circo midiático armado em torno do julgamento, perderam a oportunidade de manter silêncio edificante o prefeito Nelson Marchezan Júnior e a presidenta nacional do PT, senadora Gleise Hoffmann: o tucano, constrangendo o Governo do Estado e a Brigada Militar, foi direto à Temer pedir a presença da Guarda nacional em Porto Alegre; já a petista disse em entrevista que “para prender o Lula, (...) vai ter que matar gente”. Parafraseando Romário: calados, são dois poetas!

Assim, 2018, feito inédito nesta terra brasilis, será um ano que começará antes do Carnaval e em Porto Alegre, com Lula hoje aqui, na Esquina Democrática, e, depois, muito provavelmente, lá em Brasília, como candidato.

“Emboras lá pra vê”, como dizia o Bira lá da Cohab.


Crônica publicada no site do jornal Portal de Notíciashttp://www.portaldenoticias.com.br/ler-coluna/443/joao-adolfo-guerreiro-lula-aqui-e-la.html