A febre amarela .

Não sou um sanitarista, e até agora os mosquitos não se apaixonaram por mim, pelo menos os que transmitem essas doenças tropicais, só os vira-latas, aqueles que fazem a pele coçar.

A primeira vez que ouvi falar dessa tal "febre amarela", eu tinha quase oito anos, e o nosso navio se aproximava do Rio de Janeiro, aonde desembarcaríamos por apenas um dia, antes do destino final, que era Santos. A vacina era obrigatória , e formou-se uma enorme fila de passageiros, ordeiros e silenciosos, com exceção das crianças que pressentiam a picada da injeção ainda na espera.

Eu não chorava por essas coisas, era um moleque "durão" ...mentira ! Só não queria dar vexame, pois o meu irmão já chorava por mim, e achava feio dar espetáculo por causa de uma merda de uma espetada. O meu orgulho e a vergonha superavam o medo, essa é a verdade.

As injeções daquela época eram doloridas pra valer, as agulhas pesadas, pareciam até que iriam transpassar o braço, feito um espeto ( que exagero Pepito...). Os adultos pouco falavam, e a psicologia não andava na moda, tínhamos que aprender rápido sobre essas pequenas torturas.

Nunca imaginei que tantos anos depois a "febre amarela" voltasse à tona, e é impossível não relembrar daquele dia no navio, onde a fila serpenteava o salão de desembarque .

Já no Rio, a minha mãe foi comprar café na zona portuária, direto com os atacadistas, e remeter para os parentes da Espanha, pois o produto era raro e apreciado. Logo a seguir almoçamos em um grande restaurante do cais, onde havia um burburinho de pessoas de todos os tipos, e saímos rápido, o ambiente parecia pesado, ( me deu essa impressão), e antes do retorno pedi um gibi da banca , e a minha mãe me deu um do Saci Pererê, e imaginem o meu encantamento: Um gibi de um negrinho com uma perna só, com um cachimbo na boca e seus amiguinhos da floresta, incluindo os bichos ( macaco ,onça e tartaruga), era um choque cultural enorme.

Passei um tempão sem lhe dar um pingo de trabalho, com o dicionário de bolso e aquela revistinha mágica...Primeiro a injeção da febre amarela e depois o Saci, era muita coisa para um dia só, dormi como um anjo !

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 17/01/2018
Reeditado em 17/01/2018
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