O Equívoco
 
 
Tem coisas que só acontecem comigo.  Quando eu era estudante universitária, trabalhava o dia todo e estudava a noite. O sono era meu amigo íntimo. Domingo era o dia que  acordava  mais cedo para fazer os trabalhos da Universidade.

Num desses domingos, fui comprar um pacote de café numa mercearia próxima de casa, ainda estava com um lado dormindo e outro semi- acordado. Geralmente, para ficar à vontade em casa, visto aquela “fantasia de mendigo” que todos temos: short e camiseta surrados. Como era muito cedo fui assim mesmo.

A mercearia ainda estava fechada. Sentei-me na calçada e, sem perceber, cochilei um pouquinho. Quando acordei, um Senhor, aparentando uns 70 anos, tocava meu braço. Abri os olhos e ele me deu R$ 1,00, foi tão estranho, fiquei sem graça, sem entender nada.
 
Dias depois, precisei ir  ao centro da cidade resolver um problema na Receita Federal, que ficava num prédio encravado na Praça Rio Branco.  Eu era recém-chegada à Capital, tinha saído do mato, mas o mato ainda não tinha saído de mim, como dizem por aqui.   

Contudo, não foi possível resolver o problema porque os papéis não estavam autenticados. Eu não tinha dinheiro para pagar as autenticações, pois, por medo de ser assaltada, andava quase sem nenhum trocado, só levava o do ônibus.  Fui até um orelhão ali perto, liguei para o trabalho e pedi para alguém  levar o dinheiro.

Sentei-me no banco da praça e fiquei aguardando.  Pouco tempo depois veio um Senhor, aparentando uns 70 anos, e começou a puxar conversa comigo, o que não é muito difícil, pois minha mãe sempre dizia que eu tinha bebido água de chocalho, que falava pelos cotovelos.

A conversa fluiu rapidamente, expliquei que estava aguardando uma pessoa trazer um dinheiro para autenticar uns documentos, disse ainda, que era do interior e que tinha me mudado para poder estudar.

Para minha surpresa, aquele Senhor tirou R$ 10,00 do bolso, enrolou num papel e me entregou, saindo logo em seguida, não me dando tempo de dizer nada. Sequer de perguntar como pagá-lo.

Fiquei ali perplexa e pensado: como alguém que nem me conhece é tão generoso, nem sei como pagá-lo ou onde encontrá-lo? Que gentil! Nessa cidade as pessoas são hospitaleiras mesmo.
 
Abri o papel que enrolava o dinheiro e lá estava escrito: Rua Paissandu, número --- Quarto ---.
 
Aprendi que nunca devemos duvidar do Ser Humano, ele sempre tem um propósito, às vezes, é só ajudar mesmo.
 
 
Nota: Essa rua já foi ponto de prostituição.
Valores em reais para facilitar o entendimento, à epóca era outra moeda.