COISAS DE REIS E DE RAINHAS

Andei lendo por aí coisas de reis e rainhas... A velha e malfadada monarquia.

Fui à feira. Lá existem muitos reis: o da pamonha, o do coco ralado, o das vassouras, o do café moído na hora, do pastel, o do peixe...

Na verdade, a realeza é o povo lindo que vejo na feira. Desde os feirantes aos fregueses (aqui cabe melhor a palavra fregueses, não há no vocábulo a frescura de algumas realezas - bah, o clientes!). A freguesia anda de um lado pra outro, buscando um preço mais suave, ou seja, menos salgado.

O rei da feira hoje, para mim, foi o peixeiro, não o dono da barraca, diga-se, o empregado. Bem novinho, mocinho educado, uma fineza. Pedi um peixe bom para ser assado. Indicou-me o peixe, com toda a delicadeza do mundo. Deu-me as razões e os porquês. Aguardei, ao lado, que abrisse e limpasse o bichinho das coisinhas dispensáveis. Ele, volta e meia, olhava-me com um sorrisinho. Pediu-me desculpas pela demora e eu respondi que nem achei que demorava, pois serviço bem feito deve ser com muita paciência. Ele informou-me que estava aprendendo o ofício. Dei-lhe parabéns, pelo esforço. Entregou--me o peixe limpinho e já preparado, para que eu tivesse o mínimo de trabalho quando o fosse assar. Que rei foi o rapaz! Eu me senti súdita e fiz a ele reverência, quando novamente se desculpou pela demora. Respondi-lhe que no atual momento de minha vida, a demora não me faz diferença.

Agradeci, elogiei-lhe a educação rara e me fui com o peixe.

Na volta para casa, em frente a uma famosa e destacada confeitaria londrinense, vi a atendente entregando dois pedaços de tortas doces, de dar água na boca, a duas crianças de origem indígena, nos pratos com garfinhos. AS menininhas dos cabelos bem lisinhos e dentes lindos como os teclados de um raro piano, rasgavam ali a melodia da esperança e da doce felicidade.

Acabei de chegar em casa, após ter feito a descoberta de outras rainhas: a atendente da confeitaria e as pequenas representantes deste nosso país, hoje com um rei, cuja coroa é de lata.

Vivam os verdadeiros reis brasileiros, a quem faço minhas reverências e tiro o chapéu.

Dalva Molina Mansano.

Dalva Molina Mansano
Enviado por Dalva Molina Mansano em 12/01/2018
Código do texto: T6224191
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