A poesia do envelhecer
 
  Chega uma época da vida que é permitido errar um pouco mais para acertar o passo. Um trocadilho, meias palavras ou nas entrelinhas já não servem mais como justificativa e tampouco respostas para um assunto. As coisas precisam ser ditas por inteiras, sem dubiedade e o fitar olho no olho corresponde a maturidade, a reciprocidade, a verdade das palavras e relações.
    A face já não possui a lisura de outrora e as marcas do tempo, denunciam a longa caminhada de risos, de choro, de noites mal dormidas, de preocupações, de vitórias e frustrações. O corpo segue mais elástico, flácido e as vezes ácido pela amargura do tempo, ás vezes há mais partidas do que chegadas.
    É a velhice que bate à porta, com menos fantasia e mais realidade construída pela subjetividade. Tão insolente que ás vezes deixa-nos carentes de respostas simplistas, reducionistas e, agora sem titubear, os argumentos precisam ser convincentes.
    Um tempo também poético de boniteza impar pelos olhos de quem voz escreve. É preciso enfeitar os dias com relações mais naturais e menos virtualidades. A companhia real faz-se necessária para uma troca de ideia, de experiência, de vivência mútua e atuante.
    A velhice tem seus encantos e desencantos – o viver na sua integralidade é prioridade. Não se vive por viver, há algo a mais evocado, não se pode perder tempo, para quem tem pouco tempo.
    A premissa maior é aprender a aprender a viver. De outro modo, agora com mais sabedoria e menos euforia, mais consciência e menos divergência consigo mesmo. As relações perpassam por uma peneira e ás vezes bastante seletiva - não é prioridade a quantidade e sim a qualidade destas.
    O que era aceito com facilidade e de certa forma com ingenuidade, aqui, agora não faz mais sentido. É, a maturidade permitindo o sujeito a se permitir em ter escolhas mais prazerosas, autênticas, libertadoras e principalmente sair da zona de conforto do comodismo de uma vida sem nexo.
  O envelhecer consciente é libertador. Não há plástica que sustente um peito, uma nádega, uma celulite bem acomodada, de quem está bem com sua realidade interna. Já não é o externo que incomoda ou que satisfaz. Não é o outro que é culpado e sim, a responsabilidade de cada um por si, por seus atos, por seus feitos ou não realizados. Não se pode desculpar-se pelo não feito, o tempo do relógio vital não para.
 O tempo é agora e ás vezes insolente, desaforado, malcriado, impetuoso para quem não se atreve a florescer com novas matizes, outras ressignificações, outros modos de agir. Escuta...o tique e taque do relógio, não dorme além da hora, é tempo de se viver.
 
   Águida Hettwer
 
 
 Créditos da arte fotográfica: Lucia Trigueiro