Quando me olhei no espelho
Hoje a solidão brilhou sobre mim. Ao levantar, despi-me de todas as minhas emoções. Precisei ficar vazio para elaborar um novo look.
Olhei-me no espelho e via apenas o reflexo da minha solidão. Assustei-me. Vi um raio-x de mim quando os meus olhos atravessaram em direção ao espelho. Mas era isso o que eu queria. Tendo posto para fora tudo o que há em mim, a criatividade que havia no vazio começou a me enfeitar. Peguei o melhor sorriso e vesti. Encontrei no fundo da gaveta uma peça que combinava muito bem com ele: a coragem. Estava quase pronto, mas ainda não havia escolhido o que calçar. Não havia no guarda-roupas uma peça que combinasse com o sorriso e a coragem com os quais havia me vestido. Vaguei por alguns minutos à espera de uma solução, mas nada vinha à mente. Quando já havia desistido, olhei para fora do armário e lá no cantinho, toda empoeirada estava a humildade, calcei-a.
E assim segui meu destino: o nada.
Andei pelas ruas, passei por viadutos, sentei em frente ao mar e refleti sobre tudo o que me afligia.
Quando acreditei que a composição daquelas roupas já faziam parte de mim, peguei-me na avenida. Eu admirava o balbuciar dos carros, que traziam uma brisa oculta que atingia os meus mais profundos sentimentos. Naquele instante, fiquei, mais uma vez, vazio. Talvez meu desejo mais íntimo fosse minha hora da estrela, talvez me desfazer de mim fosse minha solução.
Busquei algumas verdades, mas todas estavam ocultas, era difícil enxergar o que valia a pena em mim.
Perdi-me por completo quando alguém me ligou, vaguei mais um pouco e voltei a mim. Ou perdi-me. Não sei bem como estou suportando as feridas que estão surgindo, tampouco o que aconteceu com as que cicatrizaram. Hoje vi sangue dentro dos meus olhos, foi, na verdade, a única coisa que vi quando me olhei no espelho.