O PRAZER DO PROIBIDO
Na minha infância fui um garoto traquinas e levado da breca. Irmão
mais velho duma prole de nove irmãos, eu dava muito trabalho à minha pobre mãe, Dona Flaviana.
Liderava os outros nas brincadeiras, dentro e fora de casa, saía pelos matos a caçar passarinhos, armar arapucas e apanhar frutinhas do mato. Comia o que via pela frente.
Minha mãe ralhava comigo e dizia:- "- Betinho, hora dessas você
come uma fruta venenosa e vai para o Pronto Socorro, meu filho!"
Mas eu era danado. Os conselhos e advertências da minha saudosa mãe entravam por um ouvido e saiam pelo outro.
Certa ocasião fui com o Aécio, o Rubinho e o Silvinho, meus irmãos mais novos e companheiros de traquinadas, para tomar banho na biquinha atrás do campo do "Esporte Clube Renascença". Era uma mina d'água que formava um pequeno poço onde nos divertíamos à beça.
Encontramos o "Ventania" pelo caminho e ele se juntou a nós. Era um moleque atrevido, quase doido, que fazia proezas como a de tomar alcóol puro que trazia num vidrinho. Seus olhos chispavam, rútilos, ele tossia muito mas batia no peito e dizia ser o "Tocha Humana", um herói dos gibis daquele tempo.
Brinca daqui, corre dali, o "Ventania" sacou o vidrinho do bolso, subiu no barranco e gritou:-
"- Com vocês, o "Tocha Humana" !... - A seguir, bebeu todo o alcóol
do vidrinho, soltou um grito, rodopiou e caiu de cabeça no pequeno lago formado na biquinha. Debateu-se, engoliu muita água e areia, vomitou que nem um cachorro engasgado, mas aprumou-se, enfim. Aí eu me virei para a patota miúda e gritei:-
"- Viva o "Tocha Humana", viva o "Ventania" !..."
Erguemos o nosso pequeno herói e o levamos, totalmente grogue, para o gramado seco atrás da biquinha, onde ele se recuperou meia hora depois. Em seguida, botaram-no no meu pescoço e partimos todos, cantando em uníssono:-
"- Hei, hei, hei, o "Tocha Humana" é o nosso rei! Hei, hei, hei"...
-o-o-o-o-o-
Jundiaí, 28/12/17