Assim ou ... nem tanto. 123
O Regresso
Volto para o Natal, havia dito. Faltava, ainda, um mês inteiro. Arranjou o telhado da casa rústica, serrou a lenha, consertou a sebe e o açude. Resistia-se melhor ao frio e à neve que já apagava os caminhos daquela solidão sentindo crepitar a lenha e vendo o fogo lamber a trempe pendurada onde os sabores da sopa se apuravam. Acabou o dia e nem vivalma surgiu na encosta do monte. Havia meia dúzia de laranjas, uma cesta com nozes, o pão fresco que metera ao forno com o tabuleiro dos biscoitos de azeite, receita da avó. – Já não vem, pensou acomodando o cão sobre o tapete de pele de carneiro. Espero pela meia-noite mas quem não arriscou viajar durante o dia, por certo não ousará percorrer o descampado entre o fim da estrada e a casa. Cansado, acabou por deitar-se vestido, calçado, com a arma à mão. O rosto escanhoado sobressaía das sombras e a lareira mantinha algumas brasas. Dormia profundamente quando o cão ladrou. Levantou a chama do candeeiro e a luz impediu-o de ver. – Quem vem lá? gritou. – Eu, respondeu uma voz arrastando o corpo esgotado. Avariou o carro no começo da subida e foi um milagre não me ter perdido, disse, antes de cair nos seus braços.