Dos obituários...
1. Quando a gente chega a uma certa idade, ler obituários torna-se uma obrigação e não uma simples e compreensível mania. Afirmo isso com a autoridade de quem chegou a essa idade, e já faz algum tempo.
2. Todas as manhãs, abro os jornais, e antes de ver o que dizem as manchetes da primeira página, faço um demorado passeio pelos obituários. De repente me aparece algum amigo ou um parente que partiu sem dizer adeus.
3. Sempre com aquele ar de solidão, os obituários trazem, para os que ficaram, a idade do defunto, o lugar do seu nascimento, o local de sua morte, e o cemitério em que ele foi enterrado ou cremado. Há obituários que ainda ensinam o que deve ser feito para que o De Cujus não dê trabalho aos seus familiares.
4. Um obituário de um jornal de Salvador, na coluna "Tira dúvidas", entre outras coisas, ensina: a) obtenha guia de sepultamento, se a morte foi natural; b) obtenha autorização judicial, atestado de óbito e laudo de um médico legista, se a morte foi violenta; c) manifestação deixada pelo defunto concordando em ser cremado.
5. É oportuno observar, que, independente da herança que deixaram e da robustez dos seus testamentos, no obituário, os defuntos se igualam; se nivelam. Fica um ao lado do outro, no mesmo barco; o barco que vai e não volta mais...
6. Em um obituário que, neste momento, tenho em mãos - eis um exemplo -, ao lado do anúncio da morte de uma senhora rica e de tradicional família baiana lê-se a nota de falecimento de um repórter de polícia, de cor escura, pobre, um coração de santo, meu velho e querido amigo de redação.
7. Se, nos obituários, os defuntos, como disse, se nivelam, o mesmo não acontece nos cemitérios que os recebem como hóspedes, sem direito a check-out. Os apatacados, em cemitérios de luxo, têm mausoléus ou sepulturas chiques; os pobre, em cemitérios modestos, têm covas rasas, que desaparecem com o tempo.
8. Ora, direis: por que essa de falar sobre defuntos, obituários e cemitérios em tempos de Natal e festejos de fim de ano? Por que não escrever sobre coisas que celebram ou alegram a vida? Aí estão os Shoppings iluminados, as praças enfeitadas, as igrejas decoradas e o Réveillon prometendo ser mais barulhento do que os de épocas passadas.
9. Respondo. Porque chegando, como cheguei, àquela certa idade, quando as festas do Natal e Ano-Novo se aproximam me vem à mente, com maior vigor, este sábio ensinamento do saudoso médium Chico Xavier:
"Sem fazer disto um pensamento mórbido, todos os dias precisamos pensar na transitoriedade da vida sobre este mundo".
10. Muito bem. Vivamos a vida em toda a sua beleza e intensidade; mas não nos esqueçamos da Irmã Morte.
11. No mais, é festejar o Natal e, no Réveillon, recitar Drummond, que nos diz no seu belo poema "Passagem do ano", o seguinte: "O último dia do ano/ Não é o último dia do tempo/ Outros dias virão./ E novas coxas e ventres te/ comunicarão o calor da vida". Mas vou continuar lendo os obituários... Por que não?
1. Quando a gente chega a uma certa idade, ler obituários torna-se uma obrigação e não uma simples e compreensível mania. Afirmo isso com a autoridade de quem chegou a essa idade, e já faz algum tempo.
2. Todas as manhãs, abro os jornais, e antes de ver o que dizem as manchetes da primeira página, faço um demorado passeio pelos obituários. De repente me aparece algum amigo ou um parente que partiu sem dizer adeus.
3. Sempre com aquele ar de solidão, os obituários trazem, para os que ficaram, a idade do defunto, o lugar do seu nascimento, o local de sua morte, e o cemitério em que ele foi enterrado ou cremado. Há obituários que ainda ensinam o que deve ser feito para que o De Cujus não dê trabalho aos seus familiares.
4. Um obituário de um jornal de Salvador, na coluna "Tira dúvidas", entre outras coisas, ensina: a) obtenha guia de sepultamento, se a morte foi natural; b) obtenha autorização judicial, atestado de óbito e laudo de um médico legista, se a morte foi violenta; c) manifestação deixada pelo defunto concordando em ser cremado.
5. É oportuno observar, que, independente da herança que deixaram e da robustez dos seus testamentos, no obituário, os defuntos se igualam; se nivelam. Fica um ao lado do outro, no mesmo barco; o barco que vai e não volta mais...
6. Em um obituário que, neste momento, tenho em mãos - eis um exemplo -, ao lado do anúncio da morte de uma senhora rica e de tradicional família baiana lê-se a nota de falecimento de um repórter de polícia, de cor escura, pobre, um coração de santo, meu velho e querido amigo de redação.
7. Se, nos obituários, os defuntos, como disse, se nivelam, o mesmo não acontece nos cemitérios que os recebem como hóspedes, sem direito a check-out. Os apatacados, em cemitérios de luxo, têm mausoléus ou sepulturas chiques; os pobre, em cemitérios modestos, têm covas rasas, que desaparecem com o tempo.
8. Ora, direis: por que essa de falar sobre defuntos, obituários e cemitérios em tempos de Natal e festejos de fim de ano? Por que não escrever sobre coisas que celebram ou alegram a vida? Aí estão os Shoppings iluminados, as praças enfeitadas, as igrejas decoradas e o Réveillon prometendo ser mais barulhento do que os de épocas passadas.
9. Respondo. Porque chegando, como cheguei, àquela certa idade, quando as festas do Natal e Ano-Novo se aproximam me vem à mente, com maior vigor, este sábio ensinamento do saudoso médium Chico Xavier:
"Sem fazer disto um pensamento mórbido, todos os dias precisamos pensar na transitoriedade da vida sobre este mundo".
10. Muito bem. Vivamos a vida em toda a sua beleza e intensidade; mas não nos esqueçamos da Irmã Morte.
11. No mais, é festejar o Natal e, no Réveillon, recitar Drummond, que nos diz no seu belo poema "Passagem do ano", o seguinte: "O último dia do ano/ Não é o último dia do tempo/ Outros dias virão./ E novas coxas e ventres te/ comunicarão o calor da vida". Mas vou continuar lendo os obituários... Por que não?