O MAR NÃO TEM MAROLA PARA MARUJO QUE FAZ BOLA

A jabureca fez a curva com não mais de 20 km/h, a porta abriu-se e o gurizote despencou sobre uma moita. Na folia, os demais nem perceberam que ele havia caído. O destino era a praia do Lamí, zona sul de Porto Alegre. A meia tarde ele chegou por lá, sem mochila, sem o lanche e com uma sede tremenda.

Assim senti-me, quando fomos morar um pouco mais além do fim do mundo, que chegava até nós, apenas pelo alto falante do radio de pilhas.

Mas nem tudo estava perdido, tínhamos a escola, onde os professores e colegas socializavam a evolução do mundo.

Na escola, havia dois pavilhões, um de alvenaria, junto a estrada e outro ao lado da cerca dos fundos, este era daqueles construídos durante o governo do estado do Rio Grande do Sul, exercido por Brizola. Depois estas escolas foram apelidadas de brizoletas, certamente por alguns puxa-sacos e assim camuflarem o real sentido de brizoletas, que eram cédulas tipo dinheiro (Letras do Tesouro), pagar fornecedores e o funcionalismo. No comércio, as letras perdiam o valor, pelo prevalecimento de quem podia recebê-las em troca de suas mercadorias, mas isto é conversa para outra ocasião.

Entre os dois prédios, havia um desnível de aproximadamente cinco metros, assim a ligação era por duas escadas, intercaladas, por um terraço ajardinado, onde havia uma tendinha, que comercializava os tais salgadinhos, chicletes, balas e docinhos.

Vovó sempre dava-nos alguns trocados, seguidamente eu ganhava uma moeda de 25 centavos de cruzeiros novos (uma delas eu tenho té hoje). Tal moeda dava para comprar algumas balas, ou chicletes. Eu preferia os chicletes, em especial o Ploc, pois trazia figurinhas com coleções de instrumentos musicais, de carros antigos e modernos e frases, das quais decorei duas:

- O mar não tem marola, para marujo que faz bola; e

- Cacique cabeleira penteada, ensina cara pálida a fazer bola gozada!

A jabureca não era nossa e tão pouco eu era autorizado a participar de tais passeios. Mas mesmo não participando, a lição pela boca dos outros serviu-me.

Quando assisti consertos, procuro identificar nas orquestras, todos os instrumentos que conheci pelas figuras enceradas e acetinadas dos chicletes Ploc.

Do livro: Abrindo gavetas da Memoria - 2017 - 2018

Quinta Crônica

ItamarCastro
Enviado por ItamarCastro em 16/12/2017
Reeditado em 16/12/2017
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