A Solidão ao Redor
Atualmente tenho tido uma relação bastante curiosa com meus vizinhos. O primeiro é um senhor que aparenta ter seus 60 anos, desconheço tudo a seu respeito, nem mesmo o reconheceria se o visse na rua. É que de segunda a sexta, logo após às 17:30, subo para a rede que fica no terraço de casa afim de ouvir um bom programa esportivo no rádio, ele começa às 18h, mas gosto de ficar observando o céu após o sol partir, considero a penumbra deste horário a coisa mais linda, dentre várias nesta vida. A forma com que o céu vai se apagando com o fim do pôr do sol é sem dúvidas uma bela visão.
Bom, neste cenário, entra meu vizinho. A algum tempo percebi que ele sempre está lá na frente de sua casa, sentado, olhando o nada a sua volta. Não vejo bem seu rosto, pois a claridade do horário não me permite grandes detalhes, nem ao menos sei se ele está a me olhar enquanto balaço na rede, mas de certo ele sempre está lá, sentado. Às vezes, tem roupas aqui no varal de casa, e não sei bem o que me leva a fazer isso, mas afasto as roupas para que daqui eu passa vê-lo e de lá ele também possa me ver.
Nunca cruzamos na rua. Eu nem mesmo ouvi sua voz. Sei que ele aparece em frente a porta sempre que uns moleques fazem barulho no seu portão. Ele olha e volta pra dentro. Ontem, percebi algo novo... Uma moça, talvez sua filha, chega às 19h do trabalho, ele parece gostar de estar lá para abrir-lhe o portão e recebê-la em casa. Tanto que, após ela chegar, ele entra novamente. Seria um pai preocupado com sua filha? Não sei, até agora é tudo muito especulativo pra mim.
Quando eu chego no terraço, ele ainda não está na frente de sua casa. Dou por mim e ele aparece, sentado, quase nunca o vejo chegando. Não tenho amigos nesta rua, nunca fui disso, mas este senhor é a única pessoa por aqui com a qual tenho algum “contato”, é como se falássemos a distância, sabe? Não olhamos nos olhos um do outro, não trocamos palavras, não gesticulamos coisas. Mas quando em meu relógio aponta 17:30, sei que irei vê-lo, e, quando ele se levanta, após sua filha chegar, entrando lentamente para dentro de sua casa, eu sei, a conversa terminou.
Logo ao lado deste senhor, tem um outro vizinho. Mora numa pequena casinha, aparentemente com sua esposa e sua filha. Este já passou diversas vezes por mim, sempre me faz um sinal com a cabeça, eu retribuo e assim ficamos bem resolvidos. Ele está corriqueiramente de cabeça baixa, porém me olha sempre nos olhos como quem esperasse algo, como quem dissesse oi sem ter dito nada. Uma coisa nele me chama atenção: ele passa o dia todo saindo para fora de casa, parece estar sempre alerta, aparece na porta, dá uma olhada e entra, é o dia inteiro assim... Mas a verdade é que sinto que sua casa é pequena demais para tantos membros (apenas três, pelo que eu saiba). E digo isso porque não é só ele, sua esposa também faz assim, nos primeiros dias achei que estavam preocupados com os moleques bagunceiros, contudo isso se estende até hoje. Esse vizinho me vê de sua casa, sei que ele me olha fixamente então também o encaro daqui.
Logo ao lado de minha casa, um terceiro vizinho constrói o próximo andar da sua... Ele faz isso praticamente sozinho, tem um parceiro, mas este, chega sempre tarde, e não é todo dia que aparece. Este terceiro vizinho, talvez por trabalhar só, ele faz tudo bem lentamente, não sei se por preguiça, desânimo, por não ter pressa de acabar, mas ele, em alguns momentos, para o que está fazendo e se senta no chão olhando o nada. Esses dias ele estava assim, mas em pé, olhando o horizonte, bem na hora que costumo subir ao terraço – é lindo observar alguém que não observa nada além dos seus próprios pensamentos. O senhor chegou e sentou-se, o segundo vizinho apareceu na porta, logo estávamos todos ali.
Passamos um tempo juntos, unidos pelo mesmo sentimento, o sentimento que nos fazia estar ali, embora nada mais que isso nos ligassem uns aos outros, além de uma mesma rua, claro. Depois de um tempo, fomos saindo, um após o outros. Voltando às nossas vidas puramente normais. Restou apenas o silêncio existencial que independe dos olhos e ouvidos humanos, pois tem coisas que são assim, estão lá, para serem sentidas.