SER CHAPECOENSE
Um ano da terrível tragédia aérea...
Filho caçula de um grande amigo meu. Sentados num banco de praça, conversávamos descontraidamente. Jovem adolescente, de uns dezessete anos, dotado de um espírito esperto, aberto e inteligente, inicialmente, punha-se a ouvir-me, com interesse, quase em silêncio, proferindo uma ou outra palavra apenas. Depois, principiou a falar de suas experiências juvenis, com lucidez e desenvoltura, das suas diversões, gostos próprios da idade, o que mais gostava de fazer e não fazer, amizades, namoros, paqueras, e até um pouco de sua casa e da família. Conversa vai, conversa vem, acabou caindo no nosso esporte mais popular e querido.
__ Sabe, fiquei bastante triste e chateado com toda aquela tragédia do acidente, mas confesso que até aí, não conhecia e mal, mal, ouvia falar desse time da Chapecoense.
__ Sério? __ Indaguei surpreso __ Você costuma não acompanhar campeonatos de futebol?
__ Raramente, e não dou importância às equipes de outros estados. Pra falar a verdade, às vezes, vejo somente jogos do Atlético, Cruzeiro, uma ou outra partida do América.
__ Pelo menos, dá pra perceber que você é desses que se mostra bem fiel ao nosso estado (riso); por falar nisso, por qual desses clubes você torce ou tem predileção?
__ Posso dizer que nenhum; só acho interessante acompanhar essas rivalidades que acontecem entre as torcidas; acho um máximo ver torcedores gozando e tirando “sarro” da cara de outros.
__ Sim, a gente sempre comenta nas rodas sobre isso, rivalidades com brincadeiras mais amenas são até bacanas e saudáveis, não dá é quando alguns torcedores se excedem e partem para agressões e ignorância, sem contar os fanáticos ou aqueles mais violentos que integram as tais torcidas organizadas. Isso é que estraga o brilho do nosso esporte mais popular e até envergonha os torcedores de bem.
__ Pois é, tocou num ponto importante, acho que é por isso que não ligo tanto para o esporte. Fico sempre pensando no horror que esses vândalos, bandidos, pois pra mim, não são torcedores, provocam... Mas, voltando à Chapecoense, o que o senhor achou de toda aquela tragédia?
__ Em primeiro lugar, uma grande irresponsabilidade por parte daqueles que deviam ter priorizado, acima de tudo, as milhares de vidas humanas expostas e perdidas no acidente aéreo. Não resta a menor dúvida de que cometeram um grande erro e poderiam tê-lo evitado e, em consequência, as dores e lágrimas de familiares e amigos. Marcou bastante e de forma profunda o final do já tão difícil ano de 2016, gerando comoção não somente no nosso país, como em, praticamente, todas as partes do mundo.
__ Confesso que nunca vi nada igual.
__ Posso afirmar que também nem eu. E olha que sou um pouco mais velho do que você (riso), mas desde muito tempo em que eu comecei a me interessar por futebol, ainda não havia visto um acidente aéreo dessa proporção que mexesse tanto assim com o brio e solidariedade de tanta gente. Despertou os corações e sentimentos mesmo daqueles que não se mostram, nenhum pouco, ligados ao mundo da bola ou daqueles que se interessam muito pouco pelo esporte.
__ Como no meu caso.
__ Pois é, e deu pra perceber que até essas rivalidades de clubes cessaram pelo menos no momento. Passaram todos a vestir uma camisa única: a do time de Chapecó. E o que estava em jogo não era somente a perda de tantos atletas do time e de outros profissionais, já que também morreu gente ligada à imprensa, ao jornalismo e à tripulação... Estava em jogo, principalmente, entre as quatro linhas do gramado, independente de tudo, a capacidade de nos solidarizarmos por tantas vidas perdidas de uma só vez, em nome da dignidade humana.
A conversa então terminou nesse ponto. O jovem adolescente se desculpou, dizendo que precisava ir, pois tinha marcado um encontro com alguns amigos naquela mesma tarde. No entanto, sem mostrar qualquer sinal de pressa, despediu-se com um leve aperto de mão, enquanto eu recomendava um abraço ao seu pai, já que fazia muito tempo que não o via.
E assim que eu me afastei, inopinadamente, ele me chamou. Voltei-me, curioso, e pude perceber os seus olhos um pouco úmidos de lágrimas, ao mesmo tempo, um semblante jovial e alegre, enquanto se aproximava e dizia:
__ Sabe, por tudo, a partir de agora, vou passar a ser Chapecoense!