VENCENDO BARREIRAS

Todos temos alguma deficiência. É, mesmo nós, os chamados normais, guardamos alguma dificuldade, seja física ou intelectual, para esta ou aquela habilidade. Mas não quero falar das dificuldades dos normais.

O que está na ordem do dia são aqueles que por algum desígnio da vida nasceram ou adquiriram alguma deficiência física.

Quando meu filho era pequeno, sempre que eu visitava minha irmã, em outra cidade, estava lá de visita uma amiga da família, que é deficiente visual. Numa dessas vezes, nem bem aparecemos na soleira da porta, ela exclamou: - Nossa, como você cresceu!

Fiquei matutando como ela percebera o tamanho do guri. Como sou meio, como dizem os jovens, “sem noção” e dada a encarar assuntos que são considerados difíceis, eu lhe perguntei como ela sabia a altura do menino. “É que eu percebo de que altura vem a voz da pessoa, a sua respiração”.

Fiquei encantada com os recursos desenvolvidos por pessoas que foram privadas de alguma habilidade que para nós, que as temos, passam tão despercebidas, porque para quem as tem é tão natural.

Nas para-olimpíadas de Atenas e nos recentes jogos para-panamericanos pude comprovar a capacidade de superação e os métodos, científicos, médicos e esportivos que permitiram aos atletas desempenharem de maneira surpreendente todas as modalidades do esporte, da natação ao tênis, arremesso de dardos, voleibol, basquetebol, corrida, corrida com obstáculos. Eu disse corrida com obstáculos? Ah! Disso eles entendem.

Focalizemos o nadador Clodoaldo Silva. Natural da cidade de Natal, Rio Grande do Norte, é pessoa da mais alta integridade, carismático, dá para perceber nos traços do seu rosto, na sua maneira de falar, no conteúdo do seu discurso. Além de ser um devorador de títulos, o nadador é um exemplo de vida. O atleta teve paralisia cerebral por falta de oxigênio durante o parto, o que afetou os movimentos das pernas, o que lhe trouxe uma falha de coordenação motora. Na para-olimpíada de Atenas, em 2004, o atleta conquistou seis medalhas de ouro e uma de prata nas oito provas em que disputou. Com isso, Clodoaldo Silva entrou para a história da natação para-olímpica brasileira como o maior medalhista da modalidade.

Hoje, Clodoaldo é reconhecido como ídolo no Brasil e no mundo. Prova disso foi a indicação para o Oscar Mundial do Esporte, em 2005, no entanto, o principal título de sua carreira não veio dessa cerimônia, mas do evento do Comitê Para-olímpico Internacional, que honrou o atleta com o troféu de melhor para-olímpico do mundo.

Em 2005 o Comitê Olímpico Brasileiro concedeu a Clodoaldo o Troféu Hors Concours, que é a maior honraria do Prêmio Brasil Olímpico. Ele e mais dois jogadores de futebol, o Ronaldo, fenômeno, e Ronaldinho Gaúcho, são os únicos a serem premiados com o título.

Para o futuro, ele sonha em estudar Psicologia e se especializar em Psicologia do Esporte. Além de atender muitas crianças e adolescentes no Instituto Clodoaldo Silva.

Clodoaldo brilha e faz seu brilho reverberar em torno dele. Incentiva seus companheiros atletas a nadarem melhor do que ele, bater seus recordes. Uma das provas mais emocionantes no Parapan foi o nado por revezamento. Clodoaldo foi o último a cair na água e contribuiu para que a equipe ganhasse o ouro na modalidade.

O Parapan nos mostra coisas surpreendentes. O futebol dos cegos. A bola possui sininhos que indicam aos jogadores a sua direção.

Até meu filho, que dificilmente se impressiona com coisas de televisão, tem uma atitude muito crítica para tudo que é mostrado na mídia, ao ver a agilidade de um nadador, exclamou: “Meu Deus, o cara nada sem braços”.

Escrevendo sobre este assunto, veio-me à lembrança um amigo de infância de meu filho. Um dia, à mesa na hora do jantar, ele disse a seu pai que queria muito jogar futebol. Seu pai lhe disse que daria a vida para que isso fosse possível, mas que infelizmente isso ele não poderia lhe proporcionar.

É. Temos muito o que aprender com essas pessoas especiais. Elas têm alguma deficiência física, mas lhes sobram vontade, capacidade mental, disciplina, empenho. Mesmo em casos mais graves, percebemos e enorme vontade de viver dessas pessoas. Nós, os normais, devíamos nos espelhar neles e usar mais o potencial de que somos dotados.

22/08/2007

Vencendo Barreiras

20h15m