Ele Existe
E era sonho e sozinha quando encostado a um muro te encontrei. Eu, precisando de ajuda. Da sua ajuda. Havia saído daquele lugar, e, tentando voltar, não encontrava mais a porta. Havia me perdido, de tão desorientada que sou. Estava desprotegida, de tão frágil que sou. Estava sozinha e corria à procura de alguma abertura. Então passei por você, e você estava ali para me ajudar. Mas se recusou quando lhe pedi para me ajudar e me guiar ao lugar para onde pensava que precisava voltar. Então expliquei que já havia andado por toda a parte, por todos os lados e quarteirões cobertos por matagais. Os medos me perseguiam e eu sabia que estavam na espreita, mas eu não conseguia e nem me veio à mente lhe explicar. E o que estava no fundo da minha consciência, é que você era um ser que eu não sabia explicar; mas ali, você estava para me ajudar. Sua criatura era diferente da minha, e por isso mesmo era a mais perfeita, pois combinava com a substância da qual eu era e sou feita. Um anjo de matéria orgânica. Um ser masculino vestido de preto. Então pedi o caminho para sair daquelas ruas e voltar àquele lugar. O motivo não me lembro mais, talvez nunca houvesse de fato. A questão é que eu precisava estar lá dentro (talvez, para novamente fugir). E então você começou a andar e eu comecei a te acompanhar, sempre com medo de me abandonar ou de ficar muito atrás e sozinha novamente. De te perder sem nunca mais atrás de você estar. Paramos em frente a um portal bloqueado na altura do nosso rosto com tábuas de madeiras na horizontal e algo que parecia gaze a bloquear a entrada. Então me falou que era uma floresta de palmeiras e perguntou-me se teria medo. Estranhei, e disse que não tenho medo de palmeiras, mas aquele nome me era estranho. Então, empurrou-me para lá dentro, e era como uma sala, sendo que o outro lado era uma parede de corpos dispostos da mesma forma que os pedaços de madeira que bloqueavam o portal atrás de mim. Mas era uma floresta de corpos que tombava para dentro da sala, buscando o outro lado. Rapidamente voltei para onde meu guia e protetor estava. Procuramos por outras saídas (entradas). Já não sabia mais se estava procurando a entrada de onde havia fugido ou a saída daquelas ruas estranhas. Fomos perseguidos por criaturas que soltavam bolhas de lâminas, as quais, em contato com as gargantas, faziam-nas sangrar e estouravam. Voamos e nos esgueiramos pelos cantos dos tetos de algum lugar, para nos safarmos. Eu nunca poderia chegar longe demais sem a sua ajuda. Chegamos à frente de uma grande porta de metal ou de aço, que mais parecia uma fornalha. Ele me disse que era a entrada para aquele lugar para onde eu quisera voltar. Eu mesma havia por várias vezes passado por aquela porta, mas sempre achei que não era boa coisa. Um rapaz foi adentrando quando a porta se abriu. A porta corrida de um lado ao outro, e não de dentro para fora. E a porta, de alguma forma, pegou-o e com ele sumiu para trás das paredes. Percebemos que aquela também não era a saída. Havia me lembrado (não sei desde quando, talvez desde sempre) que quando saí daquele lugar acompanhava uma moça (e havia tantas pessoas que saíam às pressas) e levei-a para fora, mas rapidamente voltei para o interior. Agora já não sabia o motivo de estar ali. Quando saí, era para ser breve e rapidamente retornar. Mas sabia que, de alguma forma, eu precisava estar ali com ele. Mesmo que fosse o mais estranho dos lugares. Se eu não estivesse ali fora, estaria ali dentro, não sendo pessoa nenhuma. Não sabendo que eu existia. Mas, ali fora, ele completava algo em mim que eu não sabia que faltava. E ele talvez nem fosse real, mas era uma substância que me fazia plena. Quase como se eu existisse realmente. Quase como se ele me bastasse. Quase como se eu estivesse vivendo. Ele poderia ser uma parte de mim que havia se perdido para sempre quase. Talvez fosse apenas eu mesma. Mas eu queria saber que não estava sozinha comigo apenas. Então ele veio a mim. E eu acredito que ele existe, pois ele veio por mim.