O amor tem cor e é branca: o dilema do gay negro afeminado
[Consciência Negra e Spoiller de um possível TCC]
Sei que muita gente vai dizer que é "mimimi", "vitimismo" e que racismo não existe no Brasil, mesmo com um histórico de séculos de escravidão e com uma cultura, até hoje, de embranquecimento da população e apagamento das manifestações africanas no país. No entanto, já ouvi afirmações de que sou o típico perfil que engloba "n" minorias, destoando a LGBTI+ e negra.
Fato! Nitidamente, não há o que discordar, no entanto, analisando bem a minha realidade, vejo que não há bandeiras levantadas ao negro dentro da comunidade LGBT, este que vive à margem amorosa desse meio. Pessoas com corpos sarados, de classe média e brancas modelam relacionamentos homoafetivos, enquanto o gay negro é invisibilizado e fetichizado dentro de um grupo que deveria abraçá-lo. Representatividade para quem?
Na balada, por exemplo, você sempre é aquele amigo engraçado, que faz a "ponte dos esquemas" e que quase sempre, para não dizer que não beijou, é a última opção para alguém que não quer sair da festa com um histórico de "foras". Não que um gay negro não tenha uma vida sexual ativa. Pelo contrário, há ocorrências até demais, pois, religiosamente, você tem que ser um "ativo bem dotado" e, sendo passivo, nada de ser afeminado. Mesmo assim, não é o bastante para trocas carinhosas que vão de sutis mãos dadas à exposição de um relacionamento sério aos mais próximos do imaginário parceiro.
E pode piorar, se você não abrir mão da feminilidade. Apaixonando-se por um negro, ele te troca por um branco, mesmo que mais afeminado, deixando a dúvida de quem exibe quem como troféu. Já quando há um sentimento por um branco, você não passa de um passivo fogoso para alimentar o desejo estereotipado implantado contra figuras femininas negras, advindo desde a colonização para que a curiosidade de transar com alguém de pele escura seja sanada.
Mas você segue tentando, afinal de contas é um trouxa afeminado cheio de expectativas a espera do príncipe encantado, seja o caucasiano no cavalo branco seja a realeza de ébano feita a pincel. Até que chega o momento em que as tentativas se convertem em vários motivos para chorar, após você ouvir/ler "Foi muito bom, mas estou saindo sério com outro cara". Eis que surge o questionamento retórico: "Por que não comigo, já que foi tudo tão legal?".
O pior que é cultural e ninguém tem consciência disso, exceto quem realmente sofre com a solidão amorosa de 22 anos, invejando positivamente os adolescentes que hoje saem de mãos dadas e abraçados com os namoradinhos brancos. Enquanto isso, imagens equivocadas e estereotipadas dos gays negros são reproduzidas pela indústria pornográfica e nos colocando em categorias do tipo "Amadores" e "Zoofilia", sem, é claro, deixar de marginalizar o gay negro afeminado, na tentativa de sempre remetê-lo à promiscuidade, visto também na mídia tradicional – ou você não se lembra da icônica "Vera Verão"?
Queria muito que aqui fosse discorrida uma redação dissertativa em que eu teria a chance de propor uma solução a tal problema, mas a luz no fim do túnel continua branca, onde a busca pela diversidade não é tão diversa assim, bem como a representatividade do gay negro afeminado segue como quimera dentro das bandeiras levantadas por quem tem voz nas lutas LGBTI+. Enfim, gosto é gosto, não? Mas pense bem se não há uma construção social em cima da depreciação de um povo antes de dizer que "cada um tem o seu".