FOFOCA – O BRINQUEDO ASSASSINO DE PESSOAS INFELIZES

Tinha boa formação profissional, vivia numa boa casa em um bairro tranquilo, tinha boa aparência, família e gozava ate mesmo de certo prestígio dentro de sua comunidade religiosa, mas apesar disso tudo tinha um grande problema: era fofoqueira.

Seus vizinhos a evitavam, dificilmente conseguia ficar muito tempo em um mesmo emprego, seus relacionamentos interpessoais eram inexistentes, de pouquíssimas amizades, quase não saía de casa, estava sempre nas redes sociais buscando algo que pudesse usar como fofoca, e como as redes sociais a alimentavam, ali ela ficava sabendo da vida de todos, como canta Ludmilla: “Já descobri seu truque, pra saber da minha vida, não sai do meu Facebook”.

A verdade é que a fofoca é um instrumento de controle social e que dá uma espécie de poder a quem a pratica e totalitária porque impõe uma versão dos fatos e retira do campo de julgamento moral o terceiro, à vítima, em questão, como escreveu Proust: “Os que vêm a conhecer algum detalhe exato da vida alheia tiram logo consequências que não o são, e veem no fato recém-descoberto a explicação de coisas que precisamente não têm nenhuma relação com ele”.

A fofoca é o “brinquedo assassino de pessoas infelizes”, escreveu Andreza Filizzola, e de fato é assim que funciona, o fofoqueiro é aquele que “tem seu ódio dirigido ao outro, que intenciona envenená-lo de todas as formas, é uma arma de destruição do outro dentro do laço social, uma expressão de impulsos destrutivos presentes desde o nascimento”, conceitua a psicanalista Melanie Klein, e conclui: “pois nasce da fantasia oriunda da onipotência infantil de conhecer, e dar a conhecer, a vida alheia”, sendo assim o que se encontra no fofoqueiro é um profundo sentimento de inveja.

Fofocar é uma forma de compensar os próprios complexos, falar sem provas e baseado no que se sente, ou melhor, naquilo que se quer fazer o outro sentir, elevando à importância máxima pequenos detalhes insignificantes. É interessante observar que ela sempre acontece dentro do modelo edípico, ou seja, dentro de um triângulo, onde um dos vértices denigre outro para um terceiro. Nós teríamos aqui então uma espécie de alienação parental, onde o objetivo sádico é evidente: tirar o filho do outro, golpe narcísico sem precedentes, o que equivale no simbólico, arrancar do outro aquilo que tem de mais valioso.

A verdade é que falar mal do outro é uma forma de defesa, pois todo fofoqueiro é alguém que não sabe ser feliz, e quanto mais frágil o fofoqueiro se sente mais precisará se defender, como escreveu o psiquiatra José Ângelo Gaiarsa em seu livro Tratado Geral sobre a Fofoca: "A fofoca nasce, brota, cresce e voa contra tudo o que nasce, brota, cresce e voa", e assim, se posiciona com suas frustrações, invejas e fracassos, perante alguém com uma única intenção – destruir, validando inutilmente sua autoestima, camuflando cada dia mais suas próprias amarguras e insucessos no exercício da fofoca.

Afirma a tradição judaica que: "Quando o tolo fala, ele causa a sua desgraça, pois acaba caindo na armadilha das suas próprias palavras”. E esse é o segredo para romper com este elo maldito, não dar crédito ao que está sendo falado, nas palavras do psicanalista Lacan: “Nunca dê consistência ao Outro”. Demonstre ao fofoqueiro desinteresse pelo que ele está falando, desencoraje-o e mesmo o confronte a dizer estas palavras na frente do outro que ele acusa e ele não resistirá à sua própria fofoca.

Como escreveu o psicanalista Fábio Belo: “Apontar o caráter projetivo de nossa percepção é um recurso contra a fofoca”, ou seja, passarmos a perceber o que o fofoqueiro de fato deseja e esconde em sua fofoca, pois quando falamos de alguém, estamos também falando de nós mesmos, de nossas percepções e desejos.

Jairo Carioca, escritor e psicanalista, autor do livro "Crônicas de um divã Feminino" pela editora Autografia e que já se encontra à venda nas melhores livrarias ou pelo telefone (21) 995702931.

Jairo Carioca
Enviado por Jairo Carioca em 16/11/2017
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