Guerino Valentino e Vicentina Justiniana
Um pároco, outra, sua paroquiana, mas não paravam por aí as convergências, entre o Padre Guerino Valentino Pontello, e tia Vicentina Justiniana de Miranda. Verdade que ele, da saliência do púlpito, com a sua vigorosa e abaritonada voz enunciava as disposições para a procissão enquanto ela, do modesto e já bem lisinho banco de pau concitava-nos a seguir, compungidos, a purcissão. E era tudo a mesma cousa, tudo, ao cabo, combinava.
Guerino era homem de vasta e profunda cultura, só sobrepujada pela fé, ardente até. Ministrava os sacramentos, confessava, lecionava e sobretudo pela fé administrava seu rebanho. Ticintina, que à missa não faltava, tudo ouvia e se mantinha fiel à máxima de que a um padre se obedecia e, eventualmente, achar nele beleza era pecado com certeza - e inferno com perteza.
O pouco, ou bem raro que se aproximavam era no confessionário, separados pela telinha e cortina, o vigário na constante e impetuosa pressa, e Vicentina pela ansiedade, opressa. Daí, a preferência dela por se confessar com o o já mais velho e sereno Monsenhor Vicente, ou algum outro padre visitante, de regra, mais paciente, mais tolerante.
E no que mais combinavam contudo era no dizer a expressão "para o ano". E essa expressão, dita assim dessa forma, só da boca de ambos ouvi. A gente dizia mais era "ano que vem". Só que o para o ano de Guerino referia-se sempre a manifestações divinas, como a celebração dalguma efeméride eclesiástica, porquanto o para o ano de Ticintina já era mais pedestre, como por exemplo o plantio do milharal no quintal, ou a expectativa do pé de fruta - a jabuticabeira, para ela - ficar carregadinho depois das primeiras chuvas.
Se estão ambos agora fruindo dos resplendores perpétuos, caros leitores, esperem, lhes revelarei para o ano...