O tempo
Às vezes eu dou de cara com o tempo. E quando olho no fundo dos olhos dele, vejo que eu já estou me distanciando aos pouquinhos. Sinto isso mais quando olho para os meus netinhos e penso no futuro deles. Dói muito quando penso que não vou vê-los fazer a maioria das coisas que vi meus filhos fazerem. Talvez eu vá vê-los crescer, passar pela escola, virar adolescentes e viver com eles as crises dessa época. Os mais velhos, talvez eu vá às formaturas e possa ver a escolha na vida profissional. Namoros, talvez, mas casamentos, filhos, essas coisas de geração após geração acho que o tempo não me deixará ver. Faço as contas e me consolo, quem sabe eu viva mais do que penso, quem sabe o tempo seja generoso comigo, não devo perder as esperanças. Mas olho nos olhos do tempo e só vejo reticiências. O tempo não tem jeito para enganações, ele te dá espaço e deixa que você faça as suas escolhas. Viver intensamente os momentos, viver de lembranças e saudosismo do que passou ou viver sonhando com o que virá, enquanto ele passa inexoravelmente. Tive uma lição dele esses dias.
Estava num desses momentos lindos em que a gente escolhe e pode estar com os seus num passeio, quando vi um casal com uma filhinha linda. Ela, uma mãe jovem, alegre e extrovertida, brincando na praia como se fosse criança também. Ele, um senhor de mais idade, sério e compenetrado, que observava a cena de longe, sentado como eu, admirando a paisagem e curtindo a família. Viu meus netinhos brincando e perguntou de onde éramos. Conversa vai, conversa vem, contou-me que era o seu segundo casamento, que tinha mais três filhos adultos, já casados e realizados na vida. Mas que o tempo lhe dera o presente de encontrar um novo amor e dele nasceu a menininha linda, mudando a sua vida por completo. Vi o quanto seu olhar se encheu de estrelas e o seu sorriso se tornou doce quando olhou a menininha correndo na areia. E como se fosse o tempo me dando uma lição, disse-me que sabia que a sua vida com elas seria pouca, mas que seria eterna enquanto vivesse. Por isso vivia intensamente cada momento e fazia de tudo para estar sempre junto, fazendo de tudo para viver cada sorriso e aproveitar todas as oportunidades que a vida lhe dava outra vez. Fiquei em silêncio e entendi o recado.
Não podemos controlar o amanhã. A gente só pode viver o hoje, o agora, o que está ao nosso alcance. Ficar sofrendo com o que virá ou não, só nos faz distanciar do que poderíamos estar vivendo agora. Temos muita coisa nos roubando dos nossos filhos, da nossa família, dos nossos amigos hoje. A televisão que nos remete para imagens virtuais fantasiosas, enquanto perdemos imagens reais maravilhosas ao nosso redor, sem percebermos. O vício com os celulares, games e redes sociais com amizades que só existem em diálogos figurativos, fúteis, vazios, sem o conforto do calor humano. A realidade que vivemos hoje nem sempre é realidade. Deixamos que muito do nosso tempo se perca com fantasias. E sem perceber nos distanciamos dos nossos, passamos pela vida sem viver e nos perdemos em falsas conexões. E quando vem chegando o ocaso da vida, quando a maturidade nos faz refletir com mais profundidade, vemos que a presença dos risos, dos abraços, dos encontros mais significativos de nossas vidas é que valem a pena. São eles que preenchem o nosso tempo com a força e a alegria que precisamos para viver. Estão sempre ali, ao nosso alcance, sempre esperando que a gente abra os braços para receber e guardar no coração e nas lembranças. São o nosso