A PEÇA QUE SERVE A NATA.
Nasci e cresci no meio rural, este espaço me armou do melhor que identifiquei até hoje.Desconhecia a mega valorização das classes, no sertão na minha época, ninguém se impunha ao outro, e um fio do bigode valia mais que um cheque atual.
Ali me tornei dono de mim,por não ter livros, nunca avia lido um livro físico. No entanto lia as epopeias das estrelas, e os poemas épicos das noites de luar. Ouvia as vozes das águas, e bebia o melhor que a vida pode nos dar. Mas o tempo é um trem sem freio, ele nos coloca sob várias ilusões.
Nestas lufadas do tempo, me perdi , como se diz no senso comum, cresci os olhos, e decide respirar outros ares. já maduro, cai no mundo dos livros físicos, percorri páginas imortais.Conheci a outra página da vida.
Mas veja onde quero chegar! Quero colocar na dança o valor das pessoas no mundo cão.E como me veio a ideia central desta crônica? Pois bem, até então estava abrindo os caminhos, agora cheguei na mina de ouro do meu desgosto.
Vamos lá. Perto do meu trabalho, existe uma renomada livraria, que se sustenta e é frequentadíssima pela universidade federal de Minas Gerais. E como avia dito antes, minha transformação me colocou dentro das livrarias, e lá então comecei a ver o lado obscuro das diferenças sociais. Quase sempre me sentia excluído de tal ambiente, confesso custei a perceber, como se diz no popular, eles foram batendo na cangalha para o burro entender, e não deu outra, entendi.
Lá um dia de chuva fina, e dia rabugento, estava eu dentre as prateleiras, e assim ouvia, o atendente e gerente da livraria. Olha essa obra professor, que acabamento. Doutor dê uma olhada nesta biografia. Doutora, leve esse romance, é cortesia da casa. mestre, quanto me honra sua presença. Enquanto isso eu namorava um exemplar de Dostoiévski, mais precisamente Crime e Castigo, mendigava atenção, até que depois de muito insistir, me vem o tal gerente, correu o rabo dos olhos em mim, e disse: Olha ,esse volume esta o olho da cara, mas no sebo do Amadeu, você compra pela metade do preço, e dizendo isso saiu.
Não levei tal livro , não por falta de dinheiro, mas por ter capitado a mensagem, ali era um espaço criado para graúdos. Outro dia estava na biblioteca e esse sujeito que passei a chamar de peça criada para servir a nata, aproximou-se de mim, e perguntou-me, estuda aqui, e eu secamente respondi , sim, faz qual curso, Mestrado, ele insistiu em que? Respondi, mestrado. Acredito que ele percebeu minha frieza, e assim , retirou-se arrumando seu terno surrado, continuei meus estudos. Mas essa animosidade que divide as classes , é uma pedra no meu sapato, não que eu seja chato, mas acho isso um saco.