EM COSTAS NEGRAS

Acabei de ler o livro do professor Manolo Florentino, intitulado Em Costas Negras – Uma História do Tráfico de Escravos Entre a África e o Rio de Janeiro (Séculos XVIII e XIX). Editora UNESP. São Paulo/2014.

Trata-se de pesquisa documental do comércio de escravos para fornecimento da mão de obra tanto nas cidades como nas fazendas de plantio de café, fumo ou cana de açúcar, de criação de gado e das minas de ouro e pedras preciosas no período anterior e posterior à independência.

Diferente de outras publicações onde o africano é tido e havido como o “inocente” ludibriado pelo europeu, malvado e sem escrúpulos, fica demonstrado que sempre houve interesse dos africanos, tanto político quanto comercial, na troca de mercadorias pelos escravizados resultantes de guerras entre reinos, etnias ou simples tribos, islamizadas ou não.

Para o brasileiro consumidor da mão de obra escrava era vantajoso comprar o escravo adulto, jovem e forte, pronto para uso, sem precisar investir na criação desde o nascimento até que atingisse idade e altura bastante para executar os serviços e também para o fornecedor africano, a vantagem estava em receber como pagamento armas, munição, tecidos, fumo, bebidas, etc. para uso próprio ou para celebrar alianças dentro do continente africano, cujas expedições podiam adentrar mais de mil quilômetros nas savanas e florestas.

Nesse intercâmbio havia vantagem para todos os envolvidos, quer fossem os asiáticos de Goa e Macau ou europeus, principalmente ingleses, fornecedores de tecidos, os fabricantes de armamentos, os fazendeiros produtores de fumo, açúcar, carne seca e também para os piratas ingleses, franceses e holandeses que roubavam as cargas e vendiam os escravos para as colônias do Caribe ou Sul dos Estados Unidos.

O estudo também faz referência às altas taxas de mortalidade tanto pela escassez e/ou pobreza nutricional dos alimentos, pela água de beber sem tratamento, como também devido ao contágio com a microbiota entre europeus/americanos/asiáticos/africanos causadoras de doenças até então desconhecidas dessas populações quer sejam nos navios ou após o desembarque de viagens cuja duração variava entre setenta e muitos dias, quando da costa atlântica (Congo/ Angola), a cento e vinte dias quando da costa índica (Moçambique) do continente africano.

O dinheiro da elite traficante da cidade do Rio de Janeiro, proprietária de terras, prédios e controladora do comércio, foi de suma importância para a consolidação do império brasileiro a partir da vinda de D. João e nos anos seguintes até que pelos acordos com a Inglaterra o tráfico oficial fosse proibido em 1830.

(Claro que o contrabando continuou).