Diário de Sonhos - #123: Voltando no Tempo
Estava com algum amigo ou amiga viajando pelo interior de algum país que eu não sei qual (México? Costa oeste dos EUA? Canadá?). Junto também estava sua mãe. Já era noite. Tudo estava um breu só. Não se enxergava nada. Apenas as estradas eram bem iluminadas. Estávamos perto de um pequeno vilarejo procurando um lugar pra dormir. Por algum motivo eu saí andando e me perdi no mato. Depois de muito andar cheguei a um descampado o terreno subia. Tinha subido num morro. Mais à frente havia uma construção antiga, uns pilares de pedra. Parecia uma espécie de templo primitivo. À minha direita uma ilha flutuante. Uma voz falava em minha cabeça e me forçava a andar em direção ao templo. Primeiro, num tom manso, disse que eu poderia dormir ali mesmo. Eu não estava cansado, mas ela insistia que eu estava. Olhava toda hora para a ilha flutuante. Eu achava que lá devia ter um poço de águas cristalinas onde eu poderia matar minha sede e nadar. A voz ficou descontente com minha resistência e começou a falar num tom mais grave e ameaçador. Dizia que eu deveria ser sacrificado. Eu não era nada, um bosta sem rumo na vida que não conseguia namorar, ter amigos, manter um emprego. Era instável demais, egoísta demais, covarde demais e preguiçoso demais. Isso doeu, mas era a verdade. Concordei. Caminhei por vontade própria em direção ao templo disposto a me sacrificar. Minha vida não valia nada mesmo. O templo ficava à beira de um penhasco. Lá embaixo, a cerca de uns quinze metros de altura, tinha uma espécie de pousada muito bonita. Havia uma grande piscina de águas cristalinas, igual à que eu imaginei haver na ilha flutuante. Resolvi que não queria mais me sacrificar, que queria pular naquela piscina, mas era arriscado. Se eu não caísse exatamente na piscina morreria. Com meu pensamento criei uma espécie de cópia de mim mesmo, um backup, um buraco de minhoca no tecido do espaço-tempo que eu poderia usar pra voltar àquele momento.
Pulei. Não acertei. Caí bem próximo à piscina. Me espatifei no chão. Senti todos os ossos do meu corpo fraturados e uma voz na minha cabeça "embolia! embolia!".
Estou de volta à beira do penhasco, intacto. Eu usei o buraco de minhoca. Pulo novamente, mas dessa vez consigo acertar a piscina. O problema é que eu sou muito, muito gordo, e quando caio na piscina quase toda a água é jogada pra fora. O gerente da pousada, um homem-sapo, está furioso comigo. Algumas mulheres de biquíni falam baixo e riem de mim. Homens de sunga se juntam dispostos a me dar uma lição. Eles não me querem ali. Eles não me querem em lugar nenhum. Sinto-me ainda pior, com vontade de chorar, mas é a verdade.
Estou de volta na beira do penhasco, olhando pra baixo. A piscina está cheia, os hóspedes se divertem e o gerente está contente. Aquele não é meu lugar. Volto para o templo. Tem uma faca enferrujada em cima da mesa de pedra. Vai servir.
São Paulo, doze de outubro de dois mil e dezessete.