A vida aparente e a real.

Sempre procurei a simplicidade, mesmo nos dias em que ela tentava fugir de mim, mas o consolo era saber que existia e deveria ser procurada para manter a humildade. A palavra do meu pai nunca ecoou tanto na consciência : " Filho, nunca perda a humildade, sem ela você não será nada ".

Convivi em ambiente de gente instruída, coisa de empresa grande, uma das maiores do mundo, com bom cargo ,e também vi muitas idiotices, dessas de virar o estômago. Gente que só conversava sobre poder , o carro do ano, novidades tão extremas que pareciam ter dez anos à frente. Pessoas que pareciam disputar à palmo o território da arrogância aparente, disfarçada às vezes em falsos sentimentos. Eram amigos e ao mesmo tempo disputavam espaços, então para mim, de nada serviam.

Me lembro até que uma vez, me chamaram a uma reunião na sala do presidente da empresa, pois teria um dos assuntos em pauta, e é claro que mesmo sendo um técnico, era menor perto daquelas pessoas de tão alto nível, e sem querer acabei me sentando no lugar errado ( ninguém havia me avisado). Me fizeram sinais, mas eu estava mais concentrado do que extrato de tomate, e nem percebi, então o "homem " veio e se sentou ao meu lado, para desconforto dos "idiotas", e ainda me cumprimentou com um breve sorriso. Quando chegou a minha pauta , o presidente me fez a pergunta , que respondi adequadamente e pronto, "não doeu nada", e até hoje não entendi o motivo daquela besteira toda.

Trabalhar muito não era difícil, eu vinha da área de "Produção", e qualquer coisa que viesse aos turbilhões não me assustava, em um português claro : " Era cascudo e vira-lata", no bom sentido. O que me cansava mesmo era essa atenção redobrada para se viver em ambientes chamados " competitivos", pois na verdade era "guerra fria". Na fábrica, que havia sido a minha escola, tudo era diferente , a camaradagem e a franqueza protegiam uns aos outros, todos se falavam sem melindres ou "vírgulas", tudo na cara e ninguém se odiava.

O fato de haver me instruído me alavancou a carreira, e me cobrou taxas na vida, havia perdido o ambiente e o convívio dos velhos camaradas de tantos anos , mas eu tinha família e precisava avançar . O consolo é que nunca evoluí por vaidades, nunca, sou e sempre serei um homem simples, o bicho nunca me picou, não deixei nem chegar perto, fato é que apesar dos tantos anos seguintes em áreas técnicas, nunca fui totalmente feliz como era na fábrica, e nem tive as amizades que lá ficaram, eternizadas.

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 27/09/2017
Reeditado em 27/09/2017
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