Dia Feliz

Certa vez em Ribeirão Preto, eu no dia de meu aniversário, longe da minha família, não estava muito contente. Mas todas as vezes que estava de folga ia jogar bochas em um bar nas imediações de onde ficava nossa república.

Ali conheci um senhor chamado Augusto Ferreira. Ele não jogava. Apenas apreciava as partidas e me dava muita vontade de um dia conversar com ele, com mais tempo.

Ele era viúvo e seus filhos estavam no Rio de Janeiro. Isso era o que todos sabiam. Muito educado, demonstrava uma educação superior, mas era um pouco fechado. Eu só iria voltar a Campinas com o trem P2 às 10:30 da manhã do dia seguinte.

Eu desconhecia onde o senhor Augusto morava e então resolvi andar um pouco mais numa travessa há uns 200 metros de onde eu morava. Foi então que ouvi uma voz me chamando: “O Laércio.” Ao voltar-me vi que era o senhor Augusto que me disse: “venha comigo vou te levar à minha casa. Lá poderemos conversar melhor”. Andamos mais um pouco e chegamos à sua casa. Era muito bonita e bem cuidada, com poucas plantas ornamentais no jardim. Sentamos numas cadeiras muito confortáveis. Então ele medisse:

“Se eu não estiver interrompendo algum compromisso seu, gostaria de trocar umas ideias sobre muitas coisas. Eu sinto que se você pudesse não seria foguista de trens. Eu trabalhei no Rio de Janeiro por 30 anos como psicólogo. Eu me aposentei e vim descansar aqui em Ribeirão Preto. Sou viúvo e meus filhos estão no Rio de Janeiro. Tenho aqui duas funcionárias, então pouco me preocupo com a casa. O meu tempo é livre mas não fico só sentado em jardins, como fazem muitos aposentados. Se você quiser ser útil sempre haverá alguém precisando de alguma coisa. Tenho 72 anos e o que amealhei ao longo da vida dá para viver decentemente. Dirijo duas entidades filantrópicas que ajudam pessoas carentes não só de alimentos, mas também de amor. Também sou médium espírita Kardecista, praticante”.

Ai percebi que ele queria saber algo mais de mim, além de ser um jogador de bochas. Então eu lhe disse:

“Eu gostaria de ter podido estudar medicina, mas meu pai não tinha condições de bancar meus estudos. Então a minha segunda opção era ser foguista, e mais tarde maquinista. Então estou muito feliz na carreira de trens. Gosto de músicas e de futebol. E de tudo o que a vida oferece de bom. Sou casado e tenho um filho pequeno, o Luciano Fernando, e a minha esposa Lucy. Dois amores que movem a minha vida. Sou muito feliz. E também sou médium espírita kardecista. Sempre que posso vou à casa de meu tio João, grande médium espírita, que tem me orientado muito”.

Ai o senhor Augusto me disse: “ Eu ainda enxergo um pouco e não errei com o senhor. Não é sempre que convido alguém para conversar aqui. Fiquei muito feliz. Você foi o meu presente de aniversário. Hoje estou completando 72 anos. E já recebi das minhas filhas um grande abraço, pelo telefone, lá do Rio de Janeiro”.

Então eu lhe disse: “ Eu também estou completando 34 anos de vida”. Nos abraçamos e ele que não bebia nada, também, me ofereceu um belo chá e continuamos amigos.

Mas num belo dia a Cia Mogiana de Estradas de Ferro inverteu umas escalas e eu fui trabalhar de foguista nos trens de carga que iam até Casa Branca, pernoitavam e voltavam. Eu só voltaria a trabalhar até Ribeirão Preto vários anos depois. Nada era como anteriormente: o jogo de bochas havia acabado, quando da troca do dono do bar. Perguntei sobre o senhor Augusto e me disseram que ele havia vendido sua casa e voltado para o Rio de Janeiro.

Foi uma grande amizade, dessas nas quais só temos a ganhar. Quantas orientações ele me passou, mas nunca fez prevalecer sua grande sabedoria e mediunidade. Fazia de uma maneira em que ficávamos da mesma altura.

Grande Senhor Augusto Ferreira.

Laércio
Enviado por Laércio em 10/09/2017
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