Um olhar sobre travestis

Minha filha tinha sete anos quando passamos por aquela rua, início de noite, onde ficavam as travestis. Sempre curiosa do momento e do movimento, quis saber o que as moças faziam ali.

- Trabalham, respondi com apreensiva tranquilidade.

Intrigada, pediu-me para que passássemos uma vez mais no local. E eu o fiz.

De volta à rua, silenciosos olhos de menina seguiram aquelas imagens a desfilar nas janelas de nosso carro como numa tela de tevê.

E, uma quadra adiante, concluiu:

- Quando eu crescer, quero ser como elas.

- Ser como?

- Uma mulher deslumbrante.

O olhar de uma criança é despido de qualquer preconceito. Veste-se puramente do que vê. Sem a corrupção dos padrões nem a pechincha dos tabus. E era assim que minha filha compartilhava de um simples desejo humano que a todas aquelas pessoas na via acometia: tornar-se aquilo que se via, mulher, da melhor forma que poderia... deslumbrante.