o SABIÁ
O SABIÁ
Era um domingo de sol, em plena Primavera. A luz dourada filtrava entre a folhagem das árvores, iluminando o mundo. Uma brisa fresca agitava levemente os galhos do arvoredo tornando ameno e repousante o calor. Flores de todas as matizes decoravam o jardim e enchiam o ar com seu perfume. O tom paradisíaco era completado por um lindo sabiá, que, emitindo trinados afinadíssimos, empuleirara-se no pé de ipê, como que se apresentando para uma platéia encantada.
A garagem se abriu e o carro, dirigido por um homem de meia idade, saiu, estacionando em frente à casa. Logo, abrindo a porta e correndo para fora, uma adolescente, de cerca de 15 anos, falou com o pai:
- Vamos rápido, não quero chegar tarde na praia.
Nesse instante, porém, o homem, que saíra de dentro do veículo, prestava atenção, emocionado, ao canto do sabiá. Colocando a mão no ombro de sua filha, disse:
- Espere um pouco. Ouça e veja. Haverá cena mais linda e recital mais harmonioso que este sabiá está nos proporcionando: E é somente para nós. Somos os únicos convidados. Vamos esperar um pouco, até que ele termine...
- È verdade, disse a filha. Que coisa mais linda.
E ali ficaram os dois, por cerca de 10 minutos, até que o sabiá, encerrando magistralmente o espetáculo, com um longo gorjeio, levantou vôo e foi embora.
Pai e filha, entusiasmados, aplaudiram o sabiá que se afastava.
- Agora podemos ir, filha. Vou aproveitar o que aconteceu aqui, para lhe contar uma história bastante interessante.
E enquanto dirigia o carro em direção à praia, foi narrando:
- Há muito tempo atrás, meu pai me contou a história de um outro sabiá, que foi enviado por um anjo, para orientar um homem nos caminhos de sua vida. Tal homem saiu de casa, bem cedo, para escalar uma montanha. A sua frente, em vôo rasante, ia um sabiá, que não parava de cantar. Irritado, o homem jogava para o ar, pequenos pedaços de galhos secos de árvores, não para machucar o pássaro, mas para o espantar. O sabiá voou rápido para um arbusto, mais a frente, onde o homem ia passar, e iniciou um recital de cânticos, semelhante ao que presenciamos em nosso jardim. Mas o personagem de nossa história não deu a mínima, e seguiu adiante. O sabiá, vendo que o homem não parava, começou a voar ao seu redor, sempre cantando, tentando chamar sua atenção. Num acesso de raiva o alpinista pegou uma pedra no chão e atingiu o pássaro que, rodopiando em círculos, caiu da montanha. E o nosso caminhante exclamou, enquanto seguia apressado:
- Pássaro ridículo! De forma alguma iria deixar que ele me atrasasse.
Quando chegou no alto da montanha, foi surpreendido por bandidos, que o roubaram e espancaram, enquanto comentavam entre si:
- Sorte a nossa. Se ele chegasse um pouco mais tarde, não estaríamos mais aqui.
Pai e filha continuaram conversando a respeito da história do sabiá e do anjo da guarda, quando tiveram que parar o carro, devido a um fato estranho: No meio da pista, uma enorme pedra que caíra de um caminhão, fechava a passagem, atraindo uma multidão de curiosos. Aproximaram-se do grupo a tempo de ouvir a história pela boca de alguém que presenciara o fato:
- Pois é, a suspensão da carreta cedeu, e a pedra escorregou pro meio da pista. Ainda bem que não havia nenhum carro atrás. Se não... E isso não tem mais que dez minutos.
Pai e filha se olharam, em silêncio, e resolveram, após um agradecimento ao seu anjo da guarda, voltar para o seu jardim em busca do sabiá.