Como um gato salvou
Humberto de Campos
1. Mais uma crônica do escritor Ruy Castro, publicada na "Folha de São Paulo", me põe a escrever sobre fatos e causos que os imaginava perdidos nas dobras do tempo.
2. O Ruy se declara um "Contumaz frequentador de sebos de livros". Como ele, também costumo visitar os sebos que ainda existem em Salvador.
3. Os sebos, para quem não sabe, guardam, para revenda, livros rejeitados por seus donos e outros esquecidos por nossas Editoras, apesar de preciosos.
4. Na sua crônica, o autor de A Noite do Meu Bem ressalta a importância da presença de gatos nos sebos. Diz: "Não apenas os gatos ficam bem entre os livros, como são seus guardiões nas longas noites em que os sebos ficam fechados e sob sua pior ameaça - os ratos".
5. Em seguida, recorda o gato Zulu, da Dantes, na rua Dias Ferreira, no Leblon, chamando-o de seu "gato preferido". Graças a ele, o gato, "tenho hoje a coleção completa de Arsène Lupin, da Vecchi", escreveu Ruy.
6. Atenção! Não adianta procurar o sebo Dantes, na Dias Ferreira, pois, segundo Ruy Castro, ele "não existe mais e Zulu, temo eu, também não". Portanto, estando no Leblon, vá à Livraria Argumento, compre um bom livro e tome um excelente café. Esqueça a Dantes e o gato Zulu.
7. Como eu disse, a crônica do autor de O Anjo Pornográfico, intitulada Apetite esvoaçante, trouxe-me de volta um fato que eu dava como definitivamente sepultado no mausoléu do passado, o meu, posto que, ocorrido há muitos e muitos anos.
8. Graças a um gato arisco e sorrateiro, que não era meu, mas o xodó da minha vizinha, não perdi a coleção, quase completa, de Humberto de Campos (1886-1934) que adquirira, com grande esforço, em tempos de vacas magras... Idos de 1961!
9. Um rato enorme, atrevido e ladino ameaçava os livros do autor de Sombras que sofrem, um de meus cronistas preferidos. Só não os danificara temendo ser agarrado pelo gato de dona Dalva, que atendia pelo nome de Kalunga.
10. A coleção do Humberto, com alguns livros da série Conselheiro X.X. - um tesouro esquecido pelas editoras - eu guardara num depósito, no fundo do meu quintal, enquanto comprava estantes novas para recebê-la. O tempo foi passando e o roedor fazendo suas investidas.
11. Tudo isso aconteceu, faz muitos anos! Minha casa foi demolida. No terreno, construíram um edifício. Da minha velha casa, nada restou. As máquinas mataram, sem dó, até o frondoso flamboayant que a enfeitava todas as horas...
12. Soube depois, que o Kalunga tivera um fim trágico. Morrera atropelado ao atravessar a rua, no seu pisar macio, não muito comum aos felinos. Fosse o gato Kalunga do Humberto de Campos, do saudoso cronista maranhense ganharia uma delicada crônica...
Humberto de Campos
1. Mais uma crônica do escritor Ruy Castro, publicada na "Folha de São Paulo", me põe a escrever sobre fatos e causos que os imaginava perdidos nas dobras do tempo.
2. O Ruy se declara um "Contumaz frequentador de sebos de livros". Como ele, também costumo visitar os sebos que ainda existem em Salvador.
3. Os sebos, para quem não sabe, guardam, para revenda, livros rejeitados por seus donos e outros esquecidos por nossas Editoras, apesar de preciosos.
4. Na sua crônica, o autor de A Noite do Meu Bem ressalta a importância da presença de gatos nos sebos. Diz: "Não apenas os gatos ficam bem entre os livros, como são seus guardiões nas longas noites em que os sebos ficam fechados e sob sua pior ameaça - os ratos".
5. Em seguida, recorda o gato Zulu, da Dantes, na rua Dias Ferreira, no Leblon, chamando-o de seu "gato preferido". Graças a ele, o gato, "tenho hoje a coleção completa de Arsène Lupin, da Vecchi", escreveu Ruy.
6. Atenção! Não adianta procurar o sebo Dantes, na Dias Ferreira, pois, segundo Ruy Castro, ele "não existe mais e Zulu, temo eu, também não". Portanto, estando no Leblon, vá à Livraria Argumento, compre um bom livro e tome um excelente café. Esqueça a Dantes e o gato Zulu.
7. Como eu disse, a crônica do autor de O Anjo Pornográfico, intitulada Apetite esvoaçante, trouxe-me de volta um fato que eu dava como definitivamente sepultado no mausoléu do passado, o meu, posto que, ocorrido há muitos e muitos anos.
8. Graças a um gato arisco e sorrateiro, que não era meu, mas o xodó da minha vizinha, não perdi a coleção, quase completa, de Humberto de Campos (1886-1934) que adquirira, com grande esforço, em tempos de vacas magras... Idos de 1961!
9. Um rato enorme, atrevido e ladino ameaçava os livros do autor de Sombras que sofrem, um de meus cronistas preferidos. Só não os danificara temendo ser agarrado pelo gato de dona Dalva, que atendia pelo nome de Kalunga.
10. A coleção do Humberto, com alguns livros da série Conselheiro X.X. - um tesouro esquecido pelas editoras - eu guardara num depósito, no fundo do meu quintal, enquanto comprava estantes novas para recebê-la. O tempo foi passando e o roedor fazendo suas investidas.
11. Tudo isso aconteceu, faz muitos anos! Minha casa foi demolida. No terreno, construíram um edifício. Da minha velha casa, nada restou. As máquinas mataram, sem dó, até o frondoso flamboayant que a enfeitava todas as horas...
12. Soube depois, que o Kalunga tivera um fim trágico. Morrera atropelado ao atravessar a rua, no seu pisar macio, não muito comum aos felinos. Fosse o gato Kalunga do Humberto de Campos, do saudoso cronista maranhense ganharia uma delicada crônica...