A FESTA DO MINGAU

Lembro-me como se fosse hoje. Minha mãe debruçou-se sobre a janela e com uma voz alegre e enigmática nos chamou: - Tereza, Lucinda, Pedro, Luiz¸ venham até aqui dentro que tenho uma surpresa para vocês. Mamãe sempre nos chamava assim, por ordem de idade: Tereza, com nove anos, Lucinda com sete, eu com seis e Luiz com cinco. Éramos apenas quatro, naquela época, Lucinha, Clarinha e Maria viriam depois, sem falar no Alfredo, nosso irmão de criação. Nossa família era pobre, nosso pai era funcionário público, quando eles eram muito mal remunerados, e minha mãe costurava para ajudar nas despesas. Fomos criados com arroz, feijão e ensopadinhos, tudo feito com muito esmero, além de uma grande dose de amor. Acima de tudo éramos uma família temente a Deus e desde cedo aprendemos com nossos pais a dividir o que tínhamos com quem batesse a nossa porta a procura de ajuda. Entramos na sala, curiosos e ansiosos e nos deparamos com quatro pratos de mingau de maisena sobre a mesa. Não estávamos acostumados com essas iguarias. Foi preciso mamãe dizer: - É mingau de maisena, comam. Recordo-me dos pratos cheios até a borda, quentes ainda, todos comendo pelas beiradas, para não queimar a boca, e nossa mãe sorrindo com os olhos, vendo a nossa alegria diante daquilo que para nós foi uma verdadeira festa de mingau. No meio da mesa, uma panela de alumínio raspada e vazia, de onde saíra o mingau. Só bem mais tarde me dei conta, recordando a festa, que não sobrara nada para nossa mãe. Que a felicidade dela fora nos ver saboreando o mingau, até o fim, sem se lembrar de si mesma. Hoje, adultos, filhos de pais pobres que formaram todos os filhos e lhes ensinaram o verdadeiro sentido da palavra família, rodeados por nossos próprios filhos, recordamos a eles a maior festa de toda nossa vida, que teve uma única iguaria, o mingau de maisena, e ao centro uma panela vazia, que simbolizou para todos nós o autêntico amor.