Há quem nasça sem desenvoltura social, assolado por uma timidez patológica que evolui para a misantropia com o passar do tempo. Assim, a vida segue, sem muitas palavras ditas, embebida no silêncio da introspecção, na sombra do pensamento. Sim, porque o pensamento é a sombra onde habitam os tímidos. O Sol é tudo ao redor, as conversas, os grupos animados de amigos, os bandos que caminham juntos, rindo e interagindo numa competição festiva. O tímido sempre cobiça um lugar ao sol, inutilmente. Para o misantropo, não há vida na corte, há o sertão e a aridez penosa do interminável meditar. A timidez é uma doença que aleija sua vítima em muitos aspectos relevantes; por outro, lado ela potencializa virtudes intelectuais que só podem ser cultivadas pela solidão daquele que é incapaz de se socializar plenamente. Brota no tímido uma nostalgia constante, de pequenos momentos em que se expôs ao mundo exterior, pontos raros de curva em sua existência linear. Se perguntarem a esse personagem quase mudo e invisível se a sua vida valeu a pena, talvez ele chore ao se lembrar da prisão escura em que se trancou voluntariamente, das inúmeras vezes em que olhou para o céu, para as estrelas, e percebeu que o universo é tão maior do que ele que o engoliu.