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... E O Que Era Doce Se Quebrou  


Mais um dos textos do querido poeta, Aragon Guerrero, "Cowboy" aos nove anos (quem quiser ler, aqui está o link -  
http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/5995336), me fez viajar pelo túnel do tempo. Como meus irmãos e eu tinhámos brincadeiras bacanas na nossa infância. Se tivéssemos vivido aqui no Brasil nos anos ´60 e ´70, com certeza, teríamos brincado de 'Mocinho e Bandido', mas nos EUA se brinca de 'Cowboys and Indians', nada de bandidagem, mas brincar de matar índio pode. Adorávamos incorporar os personagens da família Cartwright do seriado 'Bonanza', e principalmente o 'Daniel Boone' que retratava o herói norte americano, Davy Crockett.       

        
         
  Os Cartwrights                        Daniel Boone

E como não lembrar da primeira visita a Disney World em Orlando, e a grande decepção de saber a verdade sobre a fantasia.
Mês de julho é  um verdadeiro inferno na Florida, não só por causa do calor, mas também pela imensa quantidade de turistas. Fomos primeiro à Miami onde encontramos com o meu Tio Juca, irmão solteirão da minha Mãe. Ficamos hospedados num hotel de quatro estrelas cuja piscina era enorme e nosso quarto tinha um frigo bar repleto de refrigerante e guloseimas. Graças a Deus que nos anos ´70 ainda não havia guerra declarada à Coca-Cola, Elma Chips e McDonald´s. Não tinhámos tempo para curtir a enorme piscina. Nossos dias eram só para passear, descobrir e experimentar coisas novas o tempo todo e fazer compras nos 'malls' (shopping centers).
Meus irmãos e eu estranhamos o grande número de idosos e como eram bem diferentes dos 'velhinhos' lá de New Jersey. Eles tinham aquele brilho jovial no olhar e se vestiam com certa ousadia e muito colorido. Não ficavam escondidos em suas casas. Faziam questão de invadir as praias, os shopping centers, lanchonettes, calçadões, passeios de barco, etc, etc, etc. 

                             

Não tinha como escapar dos tapinhas na cabeça e beliscões nas bochechas a cada 'velhinho' que encontramos pelo caminho. Naquela época não se falava em filtro solar e passar férias na Florida significava voltar para casa com um belo bronzeado dourado para provar que esteve no 'Sunshine State' (sim, cada estado tem um apelido e o de New Jersey é 'Garden State'. O de New York é bem conhecido, 'The Big Apple'.). Os idosos, ou 'Senior Citizens' (Cidadãos Senior), quase todos bronzeados, invadiam as ruas à noite em busca de algum baile da Terceira Idade. Quem ainda não tinha encontrado a sua cara metade estava em busca de alguém. A ordem do dia era não ficar, nem ir para cama sozinho. Alguns até praticavam o tal 'swing' naqueles dias. Podia tudo antes da Aids aparecer. Os tempos eram outros e não de medo.  
Não havia muitas crianças em Miami. A cidade praticamente gira em torno dos idosos. O sonho de qualquer americano é se aposentar e ir morar em qaulquer cidade a beira mar da Flórida, mas nem sempre encontram aquele mar de rosas.
Quando os furacões e tornados resolvem castigar a Flórida, a população é alertrada e todos vão até o 'shelter' ou abrigo mais próximo. A minha Tia Selma certa vez comentou que num mesmo mês chegou a ir para o 'shelter' quatro vezes seguidas. Haja folego! Justamente a minha Tia Selma que tem mil alergias e espirra quase o ano inteiro, adora conforto e luxo, é paparicada por todos e não é lá muito simpática com estranhos.

                     

Fico cá imaginando a Tia num 'shelter' com mais umas centenas de pessoas, grande maioria idosos com incontinência urinária, surdo e todos desconhecidas carregando seus lindos pets peludos e barulhentos. Tadinha da minha Tia Selma.
     
Chegamos a Disney World depois de uma longa e ensolarada semana em Miami e estávamos loucos para andar em todos as atrações fantásticos e curtir tudo que tinhámos direito, afinal de contas o Papai nos presenteou com o pacote de três dias. As filas eram longas e o tempo de espera era por volta de 40 minutos para cada atração. Como sabia? Cada atração tinha um aviso que informava o tempo que o vistante levaria para embarcar na atração conforme seu lugar na fila. Ainda bem que o Papai guardava o nosso lugar, assim dava tempo da gente caçar outras atrações e não perder tempo. Tadinho dele. A minha Mãe foi mais esperta e  logo tomou seu chá de sumiço. Foi conhecer as lojas e gastar o din din que sagradamente economizou durante meses para torrar nessas férias.
Uma das atrações mais cobiçados pela garotada era o  'Davy Crockett's Explorer Canoes' que estava no topo da nossa lista, obviamente.

 
         
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Mesmo sendo menina, eu estava empolgadíssima e muito curiosa para andar de canoa. Não só andar, mas queria muito 'eu mesma' remar e aventurar naquele imenso lago como se fosse a Índia Sacagawea, a valorosa participante da expedição dos exploradores, Lewis & Clark, que serviu como guia e intérprete. Meus cabelos eram longos e adorava usá-los em tranças iguais as da Sacagawea.

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        Sim, é a mesma índia que parece no filme, 'Uma Noite No Museu'.


Meus  irmãos  estavam  tão  anciosos  quanto  eu  e  falavam em pedir para o Papai comprar um chapéu de pêlo de guaxinim igual ao do mais famoso herói do Velho Oeste dos EUA: Davy Crockett. 


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Davy Crockett   (1786 - 1836), Rei do Velho Oeste, cujo verdadeiro nome era David Crocketagne. Foi pioneiro, caçador, soldado e Representante do Tennessee no Congresso. Veio a falecer na grande batalha do Álamo no Texas.

 
Quando a nossa vez chegou, tivemos que compartilhar a canoa com mais crianças e pré-adolescentes. Haviam três irmãos em especial, todos meninos, que vestiam shorts e camisetas da mesma estampa. A própria mãe contou que não queria perdê-los na Disney portanto se preveniu e costurou todas as roupas da família com a mesma estampa. Quanto empenho, hein! Americano adora um DIY (Do It Yourself - Faça Você Mesmo). Quase todas as mulheres têm uma máquina Singer e costuram as roupas dos filhos para a Páscoa e Natal, além das fantasias de Halloween e shows das escolas.  


                     

Fiquei com muita dó dos irmãos que mais pareciam uma atração fantasiada da Disney. Meu irmão mais velho deu graças a Deus que a nossa Mãe não teve tempo para inventar nenhuma idéia fantástica como a mãe daqueles meninos. 
Subimos na canoa do Davy Crockett e lá fomos nós com o guia que deu uma aulinha vapt-vupt em como remar. Imagine um bando de crianças e adolescentes totalmente focados num guia que mal passava dos vinte anos de idade. Nossa atenção era toda dele e todos nós curtindo essa aventura na canoa do Rei do Velho Oeste  - Davy Crockett - até que um daqueles irmãos fantasiados percebeu depois de dez longos minutos remando arduamente que a maldita canoa estava ligada a um trilho e que a gente estava remando à toa. O menino gritou algo do tipo, "Ei! Isso aqui é uma farsa! Estamos remando que nem uns babacas!" Instantaneamente, todos pararam de remar, e não é que a canoa continuou seguindo a trilha traçada direitinho, e sozinha! O guia começou a remar e nos implorou inúmeras vezes para voltarmos a remar, mas quem disse que colaboramos. Para quê remar se não havia necessidade. Só me lembro que depois do passeio frustrado na canoa do Davy Crockett, toda graça, todo aquele encantamento do 'Mundo Mágico da Disney' foi pro beleleu. Os três irmãos xingaram o guia até o fim do passeio enquanto meus irmãos e eu fizemos cara de pobre coitado. Só faltava mesmo a gente chorar.
Aprendemos, ou pelo menos eu aprendi naquelas férias de verão, que muita daquela magia de criança deixa de existir quando a maldita pré-adolescência chega. Quanta crueldade, e justamente nas férias de julho de 1973 que eram para ser 'The Best' das nossas vidas. 
Calada Eu
Enviado por Calada Eu em 08/07/2017
Reeditado em 08/07/2017
Código do texto: T6049209
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