UM CARA CHAMADO LUÍS SÉRGIO DOMINGUES MENDES

UM CARA CHAMADO LUÍS SÉRGIO DOMINGUES MENDES

Cada um que passa em nossa vida passa sozinho, mas não vai só, nem nos deixa só; leva um pouco de nós mesmos, deixa um pouco de si mesmo.

Antoine De Saint Exupery

Uma característica da vida, do Universo, e de tudo que existe é a unicidade. Cada ser é único, não existe a possibilidade de duas coisas serem exatamente iguais. Este fato nos intriga, instiga e encanta. E as pessoas então nem se fala. Nunca existiu, não existe e nunca existirá uma pessoas exatamente igual a você. O comum, o normal, não existe simplesmente. Todos nós somos especiais. Mas pessoas há que marcam mais acentuadamente sua passagem na terra. Esse texto é sobre uma delas.

Eu era nadador do Clube de Regatas Tumiarú, em São Vicente. Mas nem só de esporte vive o homem. Aos fins de semana ia aos bailes, reuniões dançantes, tanto em Santos como em São Vicente. A noite era uma criança, regada a cuba libre, hi-fi, uísque, etc. E um cigarrinho Minister ou Luís XV, que ninguém era de ferro. Nessas baladas, frequentemente encontrava um dos nadadores do Internacional e, aos poucos, nos tornamos amigos. Batíamos altos papos, com um tácito acordo de nunca sequer mencionar essa noitadas nas competições ou treinos. Era um segredo nosso, que, se descoberto, pegaria mal para um nadador. Era o Luís Sérgio, nadador de peito, ou clássico, do Clube Internacional de Regatas.

Essa babaquice de não achar homem bonito não existe para mim. O cara era bonito para caramba, nariz perfeito, cabelo bem cuidado, olhos verdes, e muito bom de conversa. Envolvente, paquerador, bom dançarino, etc.. As meninas babavam no cara. Tinha os gestos que acompanhavam a sua fala, como se houvesse estudado em casa.

Transferi-me para o Internacional em 1963 e rapidamente me integrei na equipe e na turma da natação. Após o primeiro treino no novo clube sai da piscina e encontrei o Luís Sérgio muito indignado. Haviam roubado um cinto de sua mochila. O roupeiro informou que uns garotos que estavam no vestiário haviam mexido nas roupas. Saímos em busca dos moleques, fomos de ônibus até o canal 3 com a praia e encontramos os meninos. Luís Sérgio não teve dúvidas: pegou a mochila do garoto, vasculhou e encontrou seu cinto. Nem conversou. Deu uns socos no cara, esse saiu correndo, machucado. Pegou o cinto e nos despedimos ali. Boa recepção como primeiro dia de Internacional.

Daí em diante passei a conviver com uma turma ímpar, que cultuo até hoje a amizade de todos. Mas o Luís Sérgio era muito camarade meu. Éramos de bairros simples, eu da Pracinha de São Vicente, ele do Macuco, que na época era considerado barra pesada. Comparado com violência de hoje, ara um bairro de escoteiros.

Fomos passar uns dias no Rio de Janeiro. Eu, Binga(Antônio Januzzi), Luís Sérgio e Getúlio ( que depois seria delegado). Foi uma viagem memorável, que contarei em outra oportunidade.

Anos depois, Luís Sérgio foi nadar no Flamengo e morava em Botafogo. Hospedei-me na apartamento que ele morava quando fui prestar exames vestibulares. Lembro que fui a um treino com ele. O técnico era o Romulo Arantes, pai do ator, que me convidou a entrar na equipe do Flamengo.

Em 1976, eu e o Moacir Rebello tínhamos uma academia onde hoje é a Vila Rica, em Santos. Luís Sérgio tinha academia no Rio. Apareceu em casa num sábado com seu sócio. Chamamos o Moa e passamos a tarde na academia comendo churrasco regado a cerveja. Foi muito divertido, uma reunião de amigos que realmente comemoravam um reencontro, pois, já adultos, cada um tinha sua trajetória de vida definida.O Carlos Alberto Barreto contou estórias divertidas e passamos algumas horas de pura alegria, com muita música e conversas.

Foi a última vez que o vi. Meses depois, um menino assaltou a vizinha de academia do Luís Sérgio e saiu correndo perseguido por meu amigo. De repente, o garoto vira e atira. Assim me contou o sócio dele na academia. E nós ficamos sem um grande amigo, bom nadador, que toda nossa turma lembra com muito carinho e saudade.

Paulo Miorim 06/07/2017

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 07/07/2017
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