Invisível Jacaré

Invisível Jacaré

Gosto de andar de ônibus! É de certo que muitos acharão essa declaração demasiada falsa, porém, lhes garanto, é verídica!

*

Era um dia comum, exceto, pela minha excitação em chegar de pressa ao meu destino.

Subi para o ônibus coletivo, [na verdade empurrada, não precisei de muito esforço para subir.] olhei rapidamente em volta buscando desesperadamente um assento para me acomodar, quando...

Avistei dois assentos, me senti como se tivesse encontrado a passagem secreta para Eldorado. Quando me aproximava então do Santo Graal senti algo passando por mim em grande velocidade e agilidade. [essa que apenas crianças têm.]

Dei aquele sorriso forçado em busca de disfarçar meu desgosto referente a situação e enfim me acomodei.

Carlos Henrique estava agora acomodado em seu banco e gozava seu prêmio após vencer a Justa. Provavelmente era o que se passava no auge da imaginação de um garoto. [ou na imaginação de um adulto mal humorado.] Enquanto folheia uma revistinha de supermercado ele se vira e diz:

- Se eu der esse pedaço de frango para um jacaré ele ainda ficará com fome?

A voz do garoto soou como o martelo de Thor sobre a minha cabeça. Então respondi friamente a fim de romper com assunto rapidamente:

-Eu acredito que sim, esse frango não daria nem para o começo. Se brincar ele comeria até você!

O menino ignorou minha tentativa de intimida-lo e prosseguiu...

-Uh... Então eu teria que lhe dar queijo, refrigerante...

E começou a apontar para os produtos do folheto dizendo: "isso" "isso" (...).

Ao observar o entusiasmo e deslumbramento do garoto diante dos produtos percebi que era óbvio que Carlos Henrique não iria se render a minha tentativa de assusta-lo.

Ele era forte demais para isso.

Ele se virou novamente...

-Se eu der toda essa comida para o Jacaré ele será meu amigo?

Agora eu já estava envolvida com ele, curiosa pra saber o motivo pelo qual ele queria tanto fazer amizade com um Jacaré!

- Jacaré é um animal selvagem, você não pode ser amigo de um jacaré!

Sorrindo ele responde:

-Posso, vou até fazer um churrasco para ele, comprar umas cervejas... e vamos ficar ele e eu na beira do rio. E riu contente como se estivesse vivendo aquele momento ali ao meu lado. Foi tão intenso que pude sentir o cheiro da carne na brasa.

-Vamos, pare de conversar menino! Levanta agora!

O tom era assustador, firme como as esfinges do Egito.

O garoto levantou rapidamente e sacou do bolso uma carteira surrada. Retirou alguns papéis e começou a distribuir.

Nele estava escrito...

"Me chamo Carlos Henrique, tenho 10 anos, peço uma ajuda para vocês para que eu possa comprar comida para mim e meus irmãos. Qualquer ajuda é bem vinda. Deus abençoe a todos e boa viagem!"

O pai passou em seguida oferecendo balas de goma!

Confesso que me questionei sobre a vida dele e, sobretudo a respeito da minha. O garoto não tinha muito, estava vestido como um espantalho, mas o que ele não tinha em bens tinha em sorriso, uma alegria almiscarada e sonhos... E foi através de sua inventividade que ele naquele momento deixou de ser invisível.

O grande menino com seu jacaré tornou-se um símbolo de esperança, ensinou a sorrir mesmo diante dos desafios, ter coragem, enfrenta-los com alegria e criatividade. Quando a vida estiver difícil faça um churrasco para um jacaré ou apenas observe, a vida lhe mandará um Carlos Henrique.

Yasmin Meirinho
Enviado por Yasmin Meirinho em 01/07/2017
Reeditado em 01/04/2019
Código do texto: T6042940
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