Gaveta do tempo 
Aparecida Linhares 
Serahnil 


Primeiro de julho... 
Mais uma vez abro a gaveta do tempo, olho mais atentamente neste dia o que guardo nela. Inevitável é o meu gesto, por mais que eu tente não fazê-lo, ainda não descobri a maneira de sofismar o que nos fez tanto bem e agora são apenas minhas, as nossas lembranças.
Sinto falta, muita falta...
Essas lembranças que me apertam o peito e me fazem dizer pra mim mesma: eu preciso esquecer o que eu tive... Preciso parar de amar o que foi eterno, enquanto durou.
Quisera eu ter uma tênue reminiscência e não ghost...
"Para sempre", ele me dizia.
Sempre...
É muito tempo eu pensava.
Como posso não lembrar e relembrar que por ele e com ele eu sorria, enquanto era olhada com os olhos que me diziam eu te amo tanto!
Como não sentir falta do seu abraço diferenciado de mineiro, que me era dado em momentos mais inesperados?
Como não recordar dos sussurros ao pé do ouvido, mesmo quando nós estávamos a sós: "vou te amar para sempre".
Sempre...
Era muito tempo eu pensava.
Ah, os gestos imprevisíveis, aqueles que me deixavam confusa, procurando na memória que data especial eu tinha esquecido,  por ganhar num dia e hora qualquer, um presente lindamente embrulhado, acompanhado por uma, ou um buquê bem ornado de rosas amarelas,  nos cartões, sempre com a letra bem talhada as declarações e os agradecimentos por me ter em sua vida. E a nossa vida girava lenta e suavemente...
Para sempre... Ele disse várias vezes.
Sempre é muito tempo, eu pensava.
Lembro o riso que fácil saía dos seus lábios ao me ver aflita, perguntando, que dia é hoje, que data eu esqueci?
O riso amoroso vinha sempre acompanhado de palavras doces e lições de bem querer, que me faziam sentir tola, por "ainda" não crer ser possível existir alguém assim como ele.
Como esquecer que ele segurava em minha mão e dizia: - "larga tudo, vamos ali". Num piscar de olhos estávamos a caminho de um lugar paradisíaco no meio do nada e do tudo!
Tanto tempo já passou, desde que para ele chegou o "para sempre", passou mais tempo que a idade que eu tinha, quando o vi pela primeira vez à distância de uns oito metros. Na gaveta do tempo nada criou bolor, pois de nada eu me esqueci nesses anos. Não sei se quero deixar de lembrar que em todos os anos que juntos estivemos, nesta data ele perguntava: - "que quer ganhar em seu aniversário"?
A minha resposta era sempre a mesma: "você". Ele sorria bem mais e retrucava: 
- "Já tem".
Eis 1° de julho e com ele mais um ano que ouço a pergunta ecoando e não posso repetir "você".
Na gaveta do tempo está o dia quatorze, data que o meu presente do dia vinte e oito de julho não pôde mais chegar à distância do meu abraço .

*
Reminiscência: recordação do passado, " o que se mantém na memória. Resíduo ou parte fragmentada de alguma coisa que já não existe mais".
 
Aparecida Linhares (Serahnil)
Enviado por Aparecida Linhares (Serahnil) em 01/07/2017
Código do texto: T6042367
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