NOITES SEM VOCÊ
A voz se me cala no peito à medida que, inexorável, o ocaso dá lugar aos primeiros lampejos do anoitecer. Em pouco o luar me banhará com o parco brilho remanescente de seu minguante e a brisa vinda das esquinas me acariciará os cabelos revoltos e o rosto em sombras de melancolia. Não ouvirei doçuras nem sussurros cálidos dela, apenas o incansável matraquear de alguns ansiosos grilos loucos por fêmeas; já não se encontram ao meu alcance esses mimos febris de outrora, os dias os levaram para alhures inacessíveis. Doi-me reconhecer tal desdita, amargura-me dize-lo, angustia-me afirma-lo.
Essa noite será como a de tantas pretéritas, tão iguais em essência quanto comuns em saudade, tão desmedidas em lembranças quanto moldadas em si mesmas, toscas, sós, lacrimejantes e turvas, silenciosas e sem beijos, sem abraços, sem troca de olhares amorosos, desprovidas de gemidos carinhosos.
O sol não se importa com esse turbilhão de sentimentos, já arfa em seus últimos instantes; a lua também se mostra indiferente, alheia, distante, e nem ao menos me lança um mero olhar de desencanto, apenas suspira pelas estrelas em seu derredor.
Será tão-somente mais uma noite sem vida, o nada de sempre, um momento estéril, um sopro de lucidez aguardando mais um amanhecer desmotivado. Por testemunhas inusitadas dessa tristeza os pingos de chuva, alguns pernilongos esvoaçantes e atrevidos, os restos do dia esmaecido, o fechar das janelas vizinhas, o raspar do lençol na cama a um, o rolar do travesseiro sem par.