Fiscal da noite.
Quisera eu caríssimo amigo leitor, ser o fiscal da noite, e inspecionar o curso elegantíssimo do luar quando no seu esplendor, eu ficaria observando o seu curso no véu escuro da noite. A lua, objeto de desejo de todos os poetas e de todos os amantes, revelaria na sua elegante dança, todos os seus mistérios. Eu então a questionaria, e talvez, quem sabe e me permitam os leitores imaginar, um diálogo entre este singelo catador de palavras e a formosa dama da noite, ela com todo o seu brilho, rodeada por estrelas cintilantes, driblando as desavisadas nuvens que por ventura quiserem obstruir sua luminosidade. Seria de fato uma noite memorável, quisera eu ser o fiscal da noite, e poder desfrutar da presença dessa dama majestosa, que por milênios embalou os mais ardentes versos e as confissões mais ousadas. Luar que contemplou toda a história, de fracassos a vitórias, de ébrios loucos e gênios indomáveis. Talvez sim, talvez eu me torne o fiscal da noite, minha primeira noite de trabalho seria em noite de lua cheia, noite sem muitas nuvens, ou nenhuma de preferência, seria perfeito eu sei, indescritível.
Quisera eu caríssimo amigo leitor, ser o fiscal de todas as noites, eu também desejaria estar oculto em alguma praça da cidade, a mais visitada durante a noite se possível. Como eu gostaria de estar em algum canto qualquer, sem ser notado, podendo não só observar as pessoas, mas como também ouvi-las bem de perto. Com lápis e papel em mãos, eu anotaria cada palavra dita, cada segredo revelado na penumbra da noite. Os sussurros do namorado apaixonado, suas juras de amor eterno, os beijos apaixonados da jovem que cabulou as aulas da faculdade só para ficar de paquera, quisera eu, digníssimo leitor, poder anotar os diálogos secretos dos amantes, que ocultos trocam juras fantasiosas, o véu escuro da noite me revelaria as mais diferentes almas, de jovens, de adultos, e porquê não, de idosos também, quem sabe, em algum canto dessa praça haveria algum idoso desavisado, que como eu, também observa atentamente, desejando descobrir sem ser descoberto, desejando ouvir sem ser percebido, desejando ver sem ser notado. Talvez isso de fato ocorra, na noite seguinte a da lua cheia, seria perfeito eu sei, indescritível.
Quisera eu caríssimo leitor, ser o fiscal de todas as noites, enquanto todos dormem tranquilamente em suas camas quentinhas e em companhia agradável, eu, catador de palavras ao vento, estaria perambulando nas escuras ruas da minha cidade, fiscalizando a noite, observando sem ser observado. Quisera eu poder ser o fiscal de todas as noites, e poder escrever minhas histórias e meus versos desmetrificados, escreve-los ao sabor da brisa noturna, iluminado pelo luar. Quantas coisas a noite esconde de nós todos amigos leitores, quantos segredos não revelados estão a espera de fiscais atentos e observadores. As vezes acordo no meio da noite, me dirijo até a janela do meu quarto e por horas fico observando o horizonte escuro, imaginado ser, esse fiscal da noite, e assim como as corujas que nunca dormem, mas atentas e de olhares arregalados, observam cada movimento, em cada canto escuro, pequeno ou grande, visível ou não. Talvez um dia eu seja como a coruja, que a meu ver amigo leitor, e o exemplo máximo de um verdadeiro fiscal da noite. Seria perfeito eu sei, indescritível.