SUSSURROS DO MEDO.
( TEXTO PURAMENTE FICTÍCIO EM NADA RETRATA A REALIDADE DO AUTOR.)
Sou o filho da solidão, e novamente me vejo esquecido, deixado de lado, sem identidade, sem face, sem destino certo. Meus pensamentos vagueiam nesta manhã fria de fim de outono e começo de inverno. Tudo é silêncio agora, todos dorme, talvez sonham, talvez buscam no reino de fantasias, seus tesouros escondidos. Eu continuo no meu silêncio, cabisbaixo, entre mil pensamentos dissonantes, entre um amontoado de ideias erradas, e lá no âmago do coração, no mais profundo do meu ser, surge aquela angústia de sempre, aquele gosto amargo de derrota, aquela certeza sombria de que vou tombar entre as sombras da solidão. Surge então meus pensamentos, revirando dentro de mim, e aquele desejo oculto de outrora, aquela vontade súbita de acabar com tudo, por fim a vida, por fim a existência tão fracassada e mesquinha, o ar que eu respiro é precioso demais, por tanto, meus pulmões não são dignos de recebê-los. Os ponteiros do relógio correm apressados, a canção dos desesperados está sendo entoada, eu a ouço em claro e bom som, a canção da morte me chamando, a voz fúnebre do barqueiro Caronte me chamando.
Ainda não é dia, entretanto, o grito da morte ecoa ao longe, o monstro de capuz negro, foice afiada e dedos ossudos, se faz presente, e a vida aos poucos se faz ausente. Quem se importa com a vida de um desqualificado? Quem se importa afinal? Sou o filho da solidão, caminhando errante pela estrada da vida, tudo quando realizei tem a assinatura da minha incapacidade, da minha mediocridade, da minha derrota. Entre os seres viventes, humanóides desta terra de ninguém, talvez eu seja quem mais deseja não ser lembrado, o reaquecimento será a recompensa justa de quem nunca marcou a vida. Talvez haja um resquício de dignidade escondido na cova profunda, a terra que encobre engrandece aos esquecidos e desvalidos, sou no entanto, quem não deseja ser, incompreendido, desmotivado, ou talvez somente o fracasso. O que sou de verdade, nem mesmo eu sei, talvez eu não descubra nunca, talvez eu não alcance nunca a vitória. Galgar os degraus da fama, ser bem visto, ter boa índole, ser querido, ter os aplausos: Tudo isso eu desconheço, então me vejo esquecido, ridicularizado, a caminho do barco de Corante novamente.
O que é a morte afinal? Este ser desconhecido de todos, este mito que se quer conhecemos. A morte é o próprio Corante talvez, com sua embarcação do fim da estrada, onde a vida acaba e a eternidade começa, o ponto central do total esquecimento, de quem deixa para trás sua história vergonhosa. Quem afinal irá compreender o que se faz a mente insana, no seu momento insano, de nenhuma sensatez. Talvez ninguém compreenda o seu ato de loucura em plena lucidez, a tristeza lhe corrói por dentro como o cupim corrói amadora virgem. Tudo se acaba, ofim se aproxima, não há nada que possa ser feito. A vida diverge, a certeza de que nada é para sempre aumenta repetidamente. Ele será esquecido? No morro dos ventos uivantes será ele deixado? Sua cova se faz no mais do esquecido, quem é ele afinal? Qual o nome que aparecerá em sua lápide de mármore fria, deixado ao relento, deixado de lado. Sou apenas o filho da solidão em manhã estranha, caminhando na estrada sem fim, na morte que espreita a própria morte. O barqueiro Caronte está me esperando, acenando com para mim.