CRÔNICA DE ANIVERSÁRIO
Há exatos sessenta anos, mais precisamente as 18 horas do dia 12/06/1957, minha saudosa mãe percebeu que as coisas não estavam correndo dentro do previsto, eu dava sinais de relutar em deixar a toca e enfrentar o mundo, talvez já prevendo o que me esperava cá de fora. Foi então, em uma prece de fé, sendo véspera do dia de Santo Antônio, o fervoroso pedido para me desalojar de minha então cômoda posição, e parece que o santificado fez o milagre e ajudou no despejo, onde surgi nu em pelo, desdentado e careca, enchendo fraldas e mamando feito um bezerro faminto, mas um sonho de guri para os papais corujas, embora todos pareçamos com cara de joelho nas primeiras horas, na condescendência materna e paterna isso não conta... Em agradecimento sincero foi prometido ao casamenteiro que teria Antônio na certidão, ainda bem que não em primeiro; nada contra, mas ao fato de ser comum, homônimos só dão trabalho na vida civil. O nome principal herdei de meu pai, nada vistoso porém não comum e estrambólico, ouvi falar de poucos xarás. Sem refúgio acolhedor, passei a enfrentar as alegrias e tristezas de existir, e, sem saudosismos, parece que foi ontem...
Os aniversários, por serem juninos, trocava-se os refrigerantes por chás (geralmente junho é, ou foi, frio), as balas e guloseimas viravam pipocas, quentão, batata doce, doces de leite e de abóbora e pinhão, para abrilhantar as festinhas havia a fogueira e os fogos de artifícios, daqueles quase inofensivos, estilo traques. Comemorava-se o aniversário e o Santo, cúmplice do meu surgimento ao mundo dos vivos. Assim, as músicas próprias desta época festiva me acompanham, sabendo-as de cor. Ainda que na madureza da existência os encantos ficam distantes, é um mês especial, talvez saudades daqueles tempos infantis.
Preocupa-me a perda da memória de nosso folclore, assim fico feliz ao observar os pequenos travestidos de caipirinhas, rostos pintados de barbas e bigodes, roupas listradas, dançando a quadrilha; figurava-me com um resgate atemporal de nossa cultura, tão necessário preservá-la dos modismos estrangeiros e que nada representam aos nossos valores. Épocas em que valorizamos as músicas mais tradicionais, a moda de viola, o baião, o xaxado, o maxixe, o forró. Acrescidos de culturas regionais, como o bumba-meu-boi do norte e nordeste. Em um País de extensão continental, comemorarmos nossos usos e costumes, do Oiapoque ao Chui, é um troféu inquestionável de nossa união. Mantermos nossa identidade é tarefa de todo nós, patrimônio nacional.
Tempos em que a memória embotada de emoções ressuscita tantos momentos...