Manhã cinzenta

Era segunda, depois de domingo. Acordei cedo com o propósito de ir até o centro da cidade. Isso mesmo, lá onde as formigas trabalham, lá onde os vermes fervem e se agitam. Em meio a essa ordem do nosso tempo, seguia a rua principal, descendo o morro por entre os motores gritantes, que sopravam a fumaça, de modo a deixar o horizonte cinzento, misturado com a neblina da manhã que cobre os morros como um cobertor branco imenso.

Passei por dentro do coração da cidade, doente, com batimentos acelerados ... " Moço, moço, entre! "..." Promoção, promoção!!! É somente hoje, é isso aí pessoal, só aqui você encontra"... Se queres saber, consegui atravessar o vale dos crocodilos, ileso!

Rumava com destino incerto, no entanto, sempre há uma praça com um banco vazio, e ao redor, senhores conversando sobre o futebol da noite anterior... A praça, local ideal para sentar-se, ler o jornal do dia com a mesma notícia dos outros dias. É, a data para os jornais hoje, já não faz mais sentido.

Queria sentar, então sentei-me! Tava molhado...( Foi uma madrugada chuvosa, com fortes pancadas de vento). Molhei-me, isso me deixou feliz. Avistei uma barraca que vende café quentinho. Fazia frio, um café seria como um belo cobertor quente. O fato é que o frio inspira, quer dizer, me inspira. Comprei o café e o jornal com data estagnada! Voltei para o meu banco molhado... E... Havia alguém nele. Fiquei de pé olhando-o e pensando; " Só esperou-me sair para sentar..."

O homem se levanta e sai em rumo à rua. Tornei a sentar-me no banco. Que alívio. O homem seguiu até uma lixeira próxima, guardou o lixo, olhou​ para o banco; lá estava eu... Com meu café e o jornal na mão, todo folgado! O homem deve ter pensado o mesmo que eu havia pensado dele há pouco. Ri disfarçadamente para as flores não ouvirem.

As coisas as vezes voltam para você, amigo, embora eu nem tivesse feito por falta de ética. Na verdade, pensei que ele fosse embora. No entanto, o sujeito continuou a me flertar de longe, e eu o olhava pelo jornal, sem que ele percebesse. O homem que rouba banco olhou para o lado e para o outro, veio em minha direção, e eu começava a me organizar para correr quando ele, por fim falou; " Eu li essa mesma notícia no jornal de três dias atrás"...